A Economia no Século 21reforma tributária – A Economia no Século 21 http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br O olhar de um pesquisador sobre a economia contemporânea Tue, 30 Aug 2016 15:06:40 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Mais sobre a proposta do PT de reforma do IR http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/15/mais-sobre-a-proposta-do-pt-de-reforma-do-ir/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/15/mais-sobre-a-proposta-do-pt-de-reforma-do-ir/#respond Sat, 16 Jan 2016 01:53:23 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=574 Esse post procura esclarecer questões que têm sido levantadas sobre a proposta do PT de reforma do Imposto de Renda, sobre a qual falei neste post, e ilustrar melhor o efeito da proposta.

De acordo com o cálculo vigente em 2015, as alíquotas marginais são as seguintes:
Até 1.903,98 – Isento
1.903,99 até 2.826,65 – 7,5%
2.826,66 até 3751,05 – 15%
3.751,06 até 4.66,68 – 22,5%
A partir de 4.664,68 – 27,5%

Isso não significa que quem recebe R$ 2 mil por mês paga 7,5% sobre os R$ 2 mil. Essa pessoa pagará 7,5% sobre a diferença entre R$ 2.000,00 e R$ 1.903,98, e não pagará nada sobre R$ 1.903,98 (o que ela recebe até esse valor é isento). Isso dá R$ 7,20 de IR, 0,36% da renda da pessoa.

Assim, as alíquotas marginais não informam quanto é efetivamente pago de imposto de renda. A taxa efetivamente paga atualmente e a taxa efetiva proposta pela bancada do PT são mostradas no gráfico abaixo.

IR-taxaefetiva

O gráfico mostra o percentual do salário pago como imposto de renda por quem ganha até R$ 50 mil (muito pouca gente ganha mais que isso) atualmente e de acordo com a proposta. A diferença entre as duas curvas é o gráfico deste post.

Esse é o percentual pago. Em reais, o que isso significa? O gráfico abaixo mostra.

IR-pago

Quem recebe R$ 10 mil por mês, hoje paga R$ 1.880 mensais de IR; pagaria R$ 490.

Quem recebe R$ 20 mil por mês, hoje paga R$ 4.630 mensais de IR; pagaria R$ 2305.

Quem recebe R$ 40 mil por mês, hoje paga R$ 10.130 mensais de IR; pagaria R$ 7.590.

A redução no imposto propiciada pela proposta do PT é a diferença entre essas duas curvas. Por exemplo, quem recebe R$ 40 mil tem uma redução no imposto de R$ 2.540.

A redução mensal no imposto para cada nível de renda está no gráfico abaixo.

IR-reducao

Quem recebe a maior redução no IR em termos absolutos é quem ganha entre R$ 20 mil e R$ 50 mil mensais, mas todo mundo que recebe até R$ 115 mil tem uma redução no IR.

Essa redução precisa ser compensada pela queda nos dispêndios do governo ou pelo aumento em outros impostos — eis os mais pobres pagando a conta.

Bem, os muito ricos, os que recebem mais que R$ 115.000 também pagam um pouco mais. Mas quantos são esses?

A população com renda no Brasil é pouco maior que 100 milhões de pessoas. Em 2014, cerca de 26 milhões entregaram a declaração do imposto de renda. Por que tão pouca gente? Porque os pobres não precisam fazer a declaração do IR.

A parcela da população que declara IR é muito mais rica que a população que não declara (ainda que haja, dentre os não-declarantes, gente que trabalha no setor informal e ganha bem).

O gráfico abaixo mostra quantas pessoas estão em cada faixa de renda considerando apenas quem declara imposto de renda (ou seja, cerca de um quarto da população contendo a vasta maioria dos mais ricos).

IR-renda

A tabela do IR incide sobre o que eu chamei (de forma imprecisa) de salário, as barrinhas azuis. Mudanças na lei poderiam incluir outras rendas que, hoje, pagam impostos apenas de outras formas. Isso não afeta a conclusão deste post.

Os “ricos” que perdem com a proposta do PT estão na última faixa de renda (na barrinha azul, invisível, de acordo com as regras atuais, mudanças nas regras poderiam levantar a barrinha azul até a barrinha vermelha). De qualquer forma, uma fração ínfima da população.

Em suma, o PT está propondo uma grande redução nos impostos pagos pelos mais ricos, junto com um aumento nos impostos sobre um grupo ínfimo de muito ricos.

Mais leitura:

– Além de falar sobre a proposta neste post, discuti a política por trás da proposta aqui.

Detalhe:

– A Proposta da Bancada do PT propõe as seguintes alíquotas marginais:
Até 3.390,00 – Isento
3.390,01 até 6.780 – 5%
6.780.01 até 10.170 – 10%
10.170,01 até 13.560 – 15%
13.560,01 até 27.120 -20%
27.120,01 até 108.480 – 30%
A partir de 108.480,01 – 40%

Como eu expliquei, essas são alíquotas marginais, a taxa efetivamente paga é menor. Por exemplo, quem recebe R$ 115 mil por mês não pagaria 40% de imposto, pagaria 26,7% (o mesmo percentual de acordo com a tabela atual).

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A esdrúxula proposta do PT sobre o IR e a política http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/14/a-esdruxula-proposta-do-pt-sobre-o-ir-e-a-politica/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/14/a-esdruxula-proposta-do-pt-sobre-o-ir-e-a-politica/#respond Thu, 14 Jan 2016 04:00:05 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=553 Como mostrei neste post, a proposta dos deputados do PT para alterar a tabela do Imposto de Renda a Pessoa Física reduz o imposto de renda cobrado para quem ganha até um pouco mais que R$ 100 mil por mês.

O líder do PT na Câmara Sibá Machado diz que as propostas estão sendo elaboradas desde maio de 2015 e aponta essa mudança na tabela do IR como o principal ponto de um conjunto de medidas para o desenvolvimento com justiça social.

A proposta ultrapassa os limites do ridículo: em nome da justiça social, beneficia os mais ricos e reduz drasticamente a arrecadação do imposto de renda em um momento em que investimentos e gastos sociais são cortados.

Eu sei, não vai passar. Mas isso não é motivo para deixarmos o assunto de lado. Explico esse ponto de vista levantando duas perguntas:

1. A proposta parece oferecer uma chance de ouro para a oposição criticar o PT. Por que a oposição está tão quieta?

2. Por que o PT apresentou uma proposta tão esdrúxula?

Vicente Cândido, o deputado do PT que apresenta a proposta no site, é sócio de Marco Polo Del Nero, da CBF, um dos vilões do momento. A proposta dá um ganho para quem recebe R$ 70 mil por mês de uns dois salários mínimos mensais e, enquanto isso, o governo corta os benefícios sociais.

Que político perderia a chance de criticar uma proposta dessas?

Ainda assim, não vejo a oposição gritando sobre isso. Alguém viu?

Pode ser só incompetência da oposição. Pode ser que os políticos estejam em férias e os assessores brincando no joguinho do telefone.

Mas veja: se alguma coisa muito menos esdrúxula viesse da presidente, a oposição cairia em cima.

Imagine se a Dilma dissesse que vai dar um abono anual de R$ 5 mil para os assalariados que ganham R$ 50 mil mensais. A oposição estaria quieta? Essa proposta dá quase R$ 30 mil anuais para quem tem essa renda.

Ou, imagine que o PSDB propusesse esse abono anual para os ricos. Será que o PT estaria falando alguma coisa?

Isso tudo me leva a especular sobre possíveis razões para o silêncio ensurdecedor da oposição.

Hoje, o jogo da oposição é contra o governo, pelo impeachment. Mas PT e governo são coisas diferentes.

É claro que o governo será contra essa proposta bizarra do PT.

O governo entende que estamos precisando ajustar as contas públicas. Podemos questionar a forma e a velocidade do ajuste, mas é fato que as medidas que o governo tem tentado aprovar visam reduzir o déficit, não expandi-lo.

Ao ajudar a matar essa proposta, a oposição poderia estar ajudando o governo em uma disputa interna. Talvez a oposição prefira deixar o governo com esse fogo amigo. Será?

Será que o que eles tem em mente é algo como “a proposta não vai passar, mas o governo que se enfraqueça com esse problema interno”?

 

Sobre os motivos do PT para essa proposta, das duas uma: ou os deputados do PT de fato queriam reduzir o IR para quem ganha R$ 80 mil por mês, ou nem se deram ao trabalho de calcular o impacto dessa proposta na qual eles estão trabalhando desde maio.

Qualquer que seja a resposta, é difícil acreditar que a proposta seja para valer.

É quase impossível acreditar que eles tenham feito as contas e concluído “ficou ótimo, é isso mesmo que o Brasil precisa nesse momento de ajuste fiscal!”

Só posso concluir que os deputados do PT elaboraram a proposta sem considerar seriamente o que de fato aconteceria se ela fosse implementada.

E, de fato, para que pensar no que aconteceria?

Um deputado do PT, por mais tosco que seja, sabe que o governo não vai aceitar essa mudança na tabela do Imposto de Renda. Um corte dramático no IR está fora de questão.

Então, mais uma vez, o PT parece estar jogando para a torcida, sem se preocupar com a realidade.

Uma jogada estranha, mas veja:

O site do PT pergunta ao líder Sibá Machado: “vocês acreditam em uma possível resistência da oposição?” Sibá Machado diz que não, “não tem por que ficar contra a isenção da classe trabalhadora, atender à classe média.”

No site do PT, a proposta beneficia os trabalhadores e a classe média, mas a oposição, sempre contra os trabalhadores, é o obstáculo potencial à proposta.

No mundo real, o primeiro obstáculo à proposta seria o governo — e com razão!

Alguém não sabe disso?

Os frequentadores do site do PT aplaudem a proposta. Por exemplo, o presidente da Federação dos Sindicatos da Administração Tributária dos Estados, Distrito Federal e União declara no site apoio total da entidade à proposta, citando sua “justiça tributária com a observação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.”

Então talvez os deputados estejam esperando que a medida melhore a imagem deles junto aos apoiadores do PT de “classe média” (assalariados e funcionários públicos que ganham de R$ 5 mil para cima).

Essa explicação pressupõe que eles esperam que a torcida do PT não compreenda ou não vá muito a fundo nos impactos da proposta. E que não entenda que esses são os 10% mais ricos do Brasil. Ou que não queira entender. Pode ser mesmo.

Isso tudo explicaria porque agora não aparece alguém do PT defendendo a proposta. A ideia seria só jogar para a torcida do partido, sem de fato discutir o assunto. É janeiro, o público geral não vai prestar tanta atenção, a oposição vai deixar passar batido…

O problema é que esse surrealismo da nossa discussão sobre política econômica acaba se traduzindo em políticas econômicas desastrosas.

Essa proposta esdrúxula nos dá uma chance de apontar o surrealismo da discussão sobre política econômica no Brasil e, assim, trazê-la mais próxima da realidade.

Por isso, eu cobro explicações do PT. E gostaria que a oposição se manifestasse.

Mais leitura:

– Falo sobre a proposta neste post e dou mais detalhes neste post.

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A proposta do PT de reforma do Imposto de Renda http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/11/a-proposta-do-pt-de-reforma-do-imposto-de-renda/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/11/a-proposta-do-pt-de-reforma-do-imposto-de-renda/#respond Mon, 11 Jan 2016 04:00:11 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=534 Um grupo de deputados do PT apresentou recentemente ao governo um conjunto de propostas para “a retomada do desenvolvimento econômico com justiça social”.

Desse conjunto de propostas, o site do PT destaca a alteração na tabela do Imposto de Renda para Pessoas Físicas. Focarei nisso também.

O deputado Vicente Cândido (PT-SP) explica que a reforma está “em busca da justiça tributária”, pois hoje os impostos são “maiores sobre a classe média e sobre os trabalhadores”.

A mudança na tabela do IR geraria uma grande redução no imposto de renda das pessoas. O gráfico abaixo mostra a redução na taxa do imposto de renda devido, em pontos percentuais, para cada nível de renda (para o imposto pago para cada nível de renda, veja este post).

irpf-PT

Para quem ganha até R$ 1900 por mês, a proposta não faz diferença nenhuma.

Quem ganha R$ 5 mil por mês, pagaria 8,5% a menos. Quem tem salário mensal de R$ 10 mil deixa de pagar 18,8% e passa a pagar apenas 4,9%. Quem leva R$ 20 mil por mês deixa de pagar 23,2% e passa a pagar 11,5% (o IR cai pela metade).

Os trabalhadores que recebem R$ 40 mil por mês também se beneficiam da nova proposta: ao invés dos atuais 25,3%, passam a pagar 19%. Para o pessoal da classe média que leva R$ 80 mil mensais de salário, o ganho é de pouco menos de 2 pontos percentuais (mas esse ganho é maior que a renda da maioria da população).

Perde quem ganha mais que R$ 115 mil mensais. Os ricos! Eis a justiça social da proposta.

A proposta é bizarra mas ilustra um ponto que precisamos esclarecer: os ricos somos (muitos de) nós.

De acordo com o censo do IBGE de 2010, cerca de 74% das pessoas com algum rendimento recebiam menos que 2 salários mínimos. Os dados da receita federal indicam uma proporção ainda maior.

R$ 1900 é mais que 2 salários mínimos. Os mais pobres, a vasta maioria da população, têm renda inferior ao piso e não pagam IR. A proposta do PT não os afeta diretamente.

Contudo, a proposta reduz bastante a arrecadação de impostos. Assim, ou mais impostos precisarão ser coletados ou menos serviços serão prestados à população. De qualquer maneira, os mais pobres pagariam parte da conta.

Assim, os mais pobres seriam negativamente afetados por essa proposta de justiça social do PT.

A classe média que se beneficia com a proposta equivale aos 25% mais ricos da população, com exceção de uma ínfima minoria de muito ricos.

A parcela com renda superior a R$ 115.000 equivale a menos de 0,1% da população com renda (dados da receita federal, de 2013). No debate político, os ricos são os outros.

Com base nos dados da receita federal, em 2013, pouco mais de 5% da população com renda declarou rendimentos totais superiores a R$ 6.780. Pouco mais de 2% da população recebeu mais de R$ 13.560.

É difícil estimar quanta renda está no setor informal e é sonegada, então não sabemos exatamente quanto ganham os 5% ou 10% mais ricos. Ainda assim, a implicação dos dados é inescapável: a chamada classe média é a real classe alta.

Sindicatos de trabalhadores que ganham R$ 5 mil ou R$ 10 mil visam defender os direitos de seus associados, que estão dentre os 10% mais ricos. Não há nada errado com isso, em princípio.

Partidos políticos podem escolher defender essa chamada classe média, mas não me venham com discursos inflamados sobre os ricos e poderosos, não se coloquem como os guardiões dos mais pobres. Isso seria ignorância ou hipocrisia.

Na campanha para a eleição de 2001 no Reino Unido, Tony Blair disse: “justiça para mim está concentrada em levantar a renda daqueles que não tem uma renda decente. Não é minha ambição assegurar que David Beckham ganhe menos dinheiro”.

Eu concordo plenamente.

Contudo, hoje em dia, está na moda falar sobre a renda dos 0,1% mais ricos. Nada contra olhar para esses dados, mas o foco pode acabar criando uma falsa sensação de que os ricos são os outros, quando os ricos somos (muitos de) nós.

Isso não gera apenas conversas bizarras em rodas de amigos da chamada classe média. Gera, também, propostas de políticas públicas concentradoras de renda em nome da “justiça social”.

Referências:

– Explico com mais detalhes os efeitos da proposta neste post.

– Discuto a política por trás da proposta neste post.

– A proposta com a nova tabela de alíquotas do IR está no site do PT. As alíquotas marginais de acordo com a proposta são maiores para aqueles que têm renda superior a R$ 27 mil, mas o percentual efetivamente pago só é maior para quem ganha mais que R$ 115 mil mensais.

– Os dados do IBGE estão aqui, mas parecem subestimar a renda dos mais ricos. Os dados da receita federal (aqui) fornecem uma indicação mais próxima da renda das pessoas.

– A citação à frase de Tony Blair está no artigo “Spend it like Beckham? Inequality and redistribution in the UK”, de Andreas Georgiades e Alan Manning, Public Choice (2012), 151: 537-563.

Detalhe:

– Outras mudanças no imposto de renda, além da mudança na tabela, seriam necessárias para que mais que 0,01% da população passasse a pagar mais impostos com a reforma tributária proposta. Uma reforma tributária mais ampla que mexesse nesse ponto seria muito bem vinda, mas esse é assunto para outro post.

 

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