A Economia no Século 21PT – A Economia no Século 21 http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br O olhar de um pesquisador sobre a economia contemporânea Tue, 30 Aug 2016 15:06:40 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Triste aniversário http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/02/15/triste-aniversario/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/02/15/triste-aniversario/#respond Mon, 15 Feb 2016 04:00:34 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=663 1982

“Vote três, o resto é burguês” era um slogan do PT em sua primeira eleição (o número do PT era 3). Aquele era o “Partido dos Trabalhadores”, o que defenderia os oprimidos na batalha política contra os opressores.

O PT abrigava tendências trotskistas e marxistas-leninistas (Libelu, PCBR, Convergência Socialista e várias outras), mas a maior parte do partido era “reformista” no jargão da época (ou seja, não era “revolucionária”). Mesmo assim, para os padrões de hoje, era um partido de extrema esquerda.

Eu não canso de escrever que os efeitos das políticas públicas vão muito além da distribuição de recursos. Para fazer política econômica hoje em dia, ler Trotski não ensina muito mais que ler a lista telefônica. O PT de 1982 não entendia nada de Economia.

E ainda assim, o PT na época fazia sentido.

O Brasil assistia o fim gradual de um regime ditatorial. O Partido do governo, o PDS abrigava os donos do poder político, que estavam acima da lei.

Em um exemplo extremo mas emblemático, em 1963, o senador Arnon de Mello matou outro senador, em plenário, na presença de muitos outros senadores. Verdade, foi sem querer: ele tentava acertar outro senador. Punição? Nem a perda do mandato. Arnon de Mello ainda era senador em 1982, no PDS.

O PT era, dentre outras coisas, uma resposta a esse cenário político arcaico, onde a maioria da população não tinha voz. Uma resposta bastante equivocada em inúmeros aspectos, mas também um canal de participação política para diversos grupos que não se viam representados pelos outros partidos.

Fora de São Paulo, o PT de 1982 era um partido nanico. Dos 419 deputados federais eleitos em outros estados apenas 2 eram do PT.

Olívio Dutra, um dos principais líderes do PT, teria 1,5% dos votos na eleição para governador do Rio Grande do Sul (em parte, talvez, porque era difícil a competição com o PDT de Brizola, partido da então pouco conhecida Dilma Rousseff). Sandra Starling, a candidata a governadora em Minas Gerais, teria pouco mais de 2% dos votos.

Por outro lado, em São Paulo, o PT teria quase 10% dos votos e elegeria 6 dos 60 deputados federais do estado. Dois de seus principais líderes, Lula e Jacó Bittar, eram os candidatos a governador e senador, respectivamente, com Hélio Bicudo como vice-governador.

O PMDB era a oposição moderada ao regime e venceria a eleição em São Paulo com facilidade. O governador eleito Franco Montoro abriria espaço no senado para seu suplente, Fernando Henrique. Para o típico eleitor do PT, Franco Montoro e Fernando Henrique não eram os nomes ideais, mas o PDS era muito pior. O PDS era o inimigo.

Enquanto isso, no Nordeste, todos os governadores eleitos eram do PDS. No Maranhão, Sarney Filho, filho do todo poderoso José Sarney, se elegeria para o primeiro de muitos mandatos na câmara federal. Em Alagoas, o deputado federal mais votado seria Fernando Collor, filho do senador Arnon de Mello. Todos do PDS.

O PT era um partido radical. Dos 8 deputados eleitos pelo PT, 3 deles (Airton Soares, Bete Mendes e José Eudes) logo sairiam do partido por votarem em Tancredo Neves na eleição indireta para presidente contra Paulo Maluf. O PT queria boicotar a eleição indireta e não estava aberto a acordos.

1994

Fernando Collor havia sido eleito presidente e afastado do cargo pelo congresso em 1992. O PT ganhara popularidade com a campanha pelo impeachment de Collor. Lula era um forte candidato à presidência.

No Ministério da Fazenda, Fernando Henrique capitaneava o Plano Real. Era mais um dos vários planos que visavam combater a inflação desde 1986, mas diferentemente dos outros, esse não era um “plano heterodoxo”.

Os economistas do PT diziam que o plano não duraria 3 meses. Junto com o PT, Lula se opôs fortemente ao Plano Real. E perdeu a eleição.

O PT faria oposição sistemática ao governo de Fernando Henrique. Mudava o cenário político. O PSDB passava a ser o inimigo.

2003

Num dos episódios menos apreciados da nossa história política recente, as equipes do Ministério da Fazenda e do Banco Central de Lula em 2003 tinham muito pouco de petistas.

O Ministro da Fazenda, Antonio Palocci, era um político do PT e médico, mas ele não chamou nenhum dos conhecidos economistas do PT para o ministério. Bernard Appy era o único dos principais secretários ligado ao PT.

Marcos Lisboa, o principal formulador de políticas econômicas, era muito de direita para José Serra (nas palavras do próprio candidato do PSDB, eu conto essa história em livro recente). Otaviano Canuto e Joaquim Levy tampouco representavam as ideias do PT para a economia.

Para a presidência do Banco Central, iria Henrique Meirelles, deputado eleito pelo PSDB de Fernando Henrique. Boa parte dos diretores do BC do governo anterior só sairia no decorrer de 2003.

Dentre os diretores do BC empossados durante o mandato de Lula, destaco Alexandre Schwartsman, que já se referiu à Presidente Dilma como “Dona Anta” em sua coluna na Folha (e não porque mudou sua forma de pensar desde então) e Afonso Beviláqua, que seria criticado por muitos economistas liberais por defender juros altos demais.

Rui Falcão na casa civil do governo Aécio não seria mais contraditório.

Mesmo assim, não houve um processo de reorientação do partido. O PT seguiu como se nada estranho houvesse acontecido.

Dentro do governo, um dos críticos mais vocais ao BC era o vice-presidente José Alencar, milionário burguês de um partido “de direita”.

Em vários aspectos, a política econômica dos primeiros três anos do governo Lula foi muito liberal. Teve austeridade fiscal, reformas microeconômicas e até um programa de transferência de inspiração liberal (o Bolsa Família). Para a economia do país, essas políticas foram muito boas. A marca PT ganhou força.

Só que o PT não amadureceu como partido. Até 2002, o PT era o partido da oposição sistemática às políticas do tipo que o próprio partido buscaria implementar entre 2003 e 2005.

O óbvio conflito entre atos e discurso não foi resolvido, mal foi encarado. E assim, o PT foi deixando de ser um partido com identidade.

Desde 2006, o governo do PT foi caminhando para longe do receituário liberal, mas o discurso do partido continua habitando um mundo paralelo. Nesse mundo fictício, as políticas de Lula em 2003-2005 foram completamente diferentes das de FHC e parecidas com as do primeiro mandato de Dilma Rousseff. E os discursos de campanha não precisam ter qualquer relação com os planos de governo.

O aniversário

O PT que nasceu com o final da anistia representava, para muitas pessoas, a esperança equilibrista no Brasil que sonhava com a volta do irmão do Henfil.

O PT que comemora o aniversário esse mês é um partido corrupto, que não consegue afinar atos com palavras. Um partido tão perdido, que faz oposição ao seu próprio governo.

A torcida do PT se apoia no ideário de um partido que é contra os poderosos (e a ditadura), mas figuras do antigo PDS como Fernando Collor e José Sarney são hoje aliados do PT. Não seria estranho se Delfim Netto fosse ministro de Dilma.

Muita gente que construiu o PT não vai comemorar o aniversário do partido esse mês. Sandra Starling, outrora a grande liderança do PT em Minas, disse em 2014 que “votar em Dilma seria exercer o direito de ser idiota”. Hélio Bicudo, ex-companheiro de chapa de Lula, elaborou uma das ações para o impeachment de Dilma.

Jacó Bittar é mencionado nos jornais hoje porque seu filho Fernando é um dos donos do sítio de Lula em Atibaia. Longe dos holofotes, o deputado do PT mais votado em 1982, Djalma Bom, continua ligado ao PT, mas reclama da crise de identidade do partido e se ressente com as mudanças.

O problema do PT não foi mudar. Era preciso abandonar a visão econômica que pautava o esquerdismo juvenil do PT de 1982.

No melhor dos mundos, o PT teria se tornado um partido da esquerda moderna, defendendo políticas plausíveis que realmente tentaria implementar. Seria um contraponto saudável e bem vindo aos liberais, como eu.

O PT, porém, não conseguiu se reinventar. E assim, seu discurso foi se afastando da realidade e de seus planos até perder o sentido. A desonestidade intelectual tomou conta.

O PT que sopra as velhinhas em 2016 não é mais um grupo de pessoas organizado em torno de um conjunto de ideias e planos de política. É apenas um grupo de pessoas em busca do objetivo de ganhar a próxima eleição.

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A primeira reunião do Copom de 2016 http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/20/a-primeira-reuniao-do-copom-de-2016/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/20/a-primeira-reuniao-do-copom-de-2016/#respond Wed, 20 Jan 2016 04:00:54 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=593 Ao aumentar uma das taxas de juros básicas da economia (a Selic), o Banco Central torna o crédito mais caro e, portanto, desestimula o investimento e a compra de bens duráveis. Assim, aumentos nos juros tem um impacto negativo na demanda por bens na economia.

Essa redução na demanda desestimula aumentos nos preços, ajudando, portanto, a segurar a inflação, mas também desestimula a produção, tendo assim um impacto negativo sobre a atividade econômica.

Via de regra, Bancos Centrais manobram os juros para segurar a inflação quando a economia está aquecida e estimular a produção quando a economia vai mal.

Com a economia em uma grande recessão e com inflação alta, o que deve fazer o Banco Central?

A prescrição “padrão” é que o Banco Central foque em manter a inflação na meta. A ideia básica é a seguinte:

Deixar de subir os juros hoje leva a um aumento na inflação. No futuro, para trazer a inflação de volta, o governo teria que subir os juros e desestimular a economia.

A escolha é, portanto, entre juros altos agora ou depois, mas quanto mais se demora para subir os juros, mais tempo ficamos com inflação alta.

Melhor então já subir os juros de uma vez?

Bem, a alta dos juros em um momento de forte recessão é particularmente ruim, então há vantagens em postergar esse aumento dos juros para depois.

OK, mas então por que a prescrição “padrão” é focar em manter a inflação na meta?

As ações do Banco Central afetam a expectativa de inflação. Se todos sabemos que o Banco Central foca em manter a inflação baixa, nós esperamos inflação menor para o futuro.

Essas expectativas afetam as decisões de pessoas e empresas na hora de negociar salários e decidir preços. Assim, a expectativa de inflação baixa empurra para baixo a própria inflação.

Por isso, a prescrição padrão é focar na inflação.

Entretanto, no momento, há dois fatores muito importantes para a decisão do Banco Central que afetam esse quadro.

O primeiro é o quadro fiscal. Se o governo não arrecada o suficiente para pagar as contas, é preciso arrumar outros meios de conseguir dinheiro. Em geral, toma-se dinheiro emprestado.

Contudo, se a dívida é muito alta, começam a existir dúvidas sobre a capacidade de repagamento. Tomar emprestado fica mais caro e mais difícil.

Nesse cenário, é possível que a inflação acabe sendo o imposto que ajuda a fechar as contas (como eu expliquei em alguns posts, como este).

Juros mais altos aumentam a conta do governo; inflação mais alta reduz essa conta. Assim, uma alta nos juros é má notícia para a situação fiscal.

Portanto, em uma situação de dívida alta e desequilíbrio fiscal, o aumento nos juros pode tornar ainda mais difícil segurar a inflação no futuro.

Assim, sob o ponto de vista estritamente econômico, a posição contra o aumento de juros hoje é perfeitamente defensável. Se o remédio com efeitos colaterais não funciona bem, para que tomá-lo?

Há, porém, um segundo fator, ligado à política.

De acordo com as notícias, há bastante gente no PT e no governo pressionando por juros mais baixos.

Apesar da posição sobre os juros ser razoável em termos econômicos, pressões políticas sobre o Banco Central, em geral, não são. Mais importante, o caminho para a economia que essas pessoas defendem é desastroso.

No primeiro mandato, Dilma buscou trilhar esse caminho. Nessa toada, o Banco Central levou a taxa Selic para 7,25% em 2012 (apesar da inflação em alta e acima da meta).

O resultado foi o aumento da inflação dos preços que o governo não controla. A economia passou a ir de mal a pior (apesar de juros baixos, em geral, estimularem a demanda).

O problema foi a perda de confiança na condução da economia.

Nesse segundo mandato, o governo tem sinalizado uma mudança de postura. Porém, pairam dúvidas sobre o que o governo de fato pretende fazer e sobre sua capacidade de colocar seus planos em prática.

Muitos no PT continuam defendendo o desrespeito às leis da economia e apresentando propostas sem pensar de fato em suas consequências (como ilustra essa proposta).

Nesse contexto, uma alta dos juros poderia ser uma mensagem ao mercado mais ou menos assim:

“Todos sabemos que há gente no governo e no PT que ainda defende as políticas adotadas durante o primeiro mandato, que nos trouxeram a essa crise. Essas pessoas não estão dando as ordens aqui.”

Essa mensagem poderia ajudar o governo a conquistar um pouquinho da confiança perdida. Por outro lado, não mandar a mensagem poderia levantar mais dúvidas.

Claro, a mensagem só funciona se acabar sendo mesmo uma demonstração de força. Muitos no PT chiariam. O fogo amigo seria disparado contra o Banco Central. Gente como Jaques Wagner teria que matar essa bola no peito e controlar o jogo.

A presidente não se pronunciaria, mandando outra mensagem: “aquela história de pratos de comida sumindo das mesas por conta de um BC independente, que contamos durante a campanha, era uma mentira deslavada, fiquem tranquilos.”

Em suma, em termos puramente econômicos, não é nada claro que o BC deva subir os juros, apesar da inflação alta, por conta da recessão e do quadro fiscal.

Contudo, a oposição de setores do PT à alta dos juros oferece ao Banco Central a oportunidade de mandar uma mensagem. A alta dos juros seria o preço dessa mensagem.

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Mais sobre a proposta do PT de reforma do IR http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/15/mais-sobre-a-proposta-do-pt-de-reforma-do-ir/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/15/mais-sobre-a-proposta-do-pt-de-reforma-do-ir/#respond Sat, 16 Jan 2016 01:53:23 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=574 Esse post procura esclarecer questões que têm sido levantadas sobre a proposta do PT de reforma do Imposto de Renda, sobre a qual falei neste post, e ilustrar melhor o efeito da proposta.

De acordo com o cálculo vigente em 2015, as alíquotas marginais são as seguintes:
Até 1.903,98 – Isento
1.903,99 até 2.826,65 – 7,5%
2.826,66 até 3751,05 – 15%
3.751,06 até 4.66,68 – 22,5%
A partir de 4.664,68 – 27,5%

Isso não significa que quem recebe R$ 2 mil por mês paga 7,5% sobre os R$ 2 mil. Essa pessoa pagará 7,5% sobre a diferença entre R$ 2.000,00 e R$ 1.903,98, e não pagará nada sobre R$ 1.903,98 (o que ela recebe até esse valor é isento). Isso dá R$ 7,20 de IR, 0,36% da renda da pessoa.

Assim, as alíquotas marginais não informam quanto é efetivamente pago de imposto de renda. A taxa efetivamente paga atualmente e a taxa efetiva proposta pela bancada do PT são mostradas no gráfico abaixo.

IR-taxaefetiva

O gráfico mostra o percentual do salário pago como imposto de renda por quem ganha até R$ 50 mil (muito pouca gente ganha mais que isso) atualmente e de acordo com a proposta. A diferença entre as duas curvas é o gráfico deste post.

Esse é o percentual pago. Em reais, o que isso significa? O gráfico abaixo mostra.

IR-pago

Quem recebe R$ 10 mil por mês, hoje paga R$ 1.880 mensais de IR; pagaria R$ 490.

Quem recebe R$ 20 mil por mês, hoje paga R$ 4.630 mensais de IR; pagaria R$ 2305.

Quem recebe R$ 40 mil por mês, hoje paga R$ 10.130 mensais de IR; pagaria R$ 7.590.

A redução no imposto propiciada pela proposta do PT é a diferença entre essas duas curvas. Por exemplo, quem recebe R$ 40 mil tem uma redução no imposto de R$ 2.540.

A redução mensal no imposto para cada nível de renda está no gráfico abaixo.

IR-reducao

Quem recebe a maior redução no IR em termos absolutos é quem ganha entre R$ 20 mil e R$ 50 mil mensais, mas todo mundo que recebe até R$ 115 mil tem uma redução no IR.

Essa redução precisa ser compensada pela queda nos dispêndios do governo ou pelo aumento em outros impostos — eis os mais pobres pagando a conta.

Bem, os muito ricos, os que recebem mais que R$ 115.000 também pagam um pouco mais. Mas quantos são esses?

A população com renda no Brasil é pouco maior que 100 milhões de pessoas. Em 2014, cerca de 26 milhões entregaram a declaração do imposto de renda. Por que tão pouca gente? Porque os pobres não precisam fazer a declaração do IR.

A parcela da população que declara IR é muito mais rica que a população que não declara (ainda que haja, dentre os não-declarantes, gente que trabalha no setor informal e ganha bem).

O gráfico abaixo mostra quantas pessoas estão em cada faixa de renda considerando apenas quem declara imposto de renda (ou seja, cerca de um quarto da população contendo a vasta maioria dos mais ricos).

IR-renda

A tabela do IR incide sobre o que eu chamei (de forma imprecisa) de salário, as barrinhas azuis. Mudanças na lei poderiam incluir outras rendas que, hoje, pagam impostos apenas de outras formas. Isso não afeta a conclusão deste post.

Os “ricos” que perdem com a proposta do PT estão na última faixa de renda (na barrinha azul, invisível, de acordo com as regras atuais, mudanças nas regras poderiam levantar a barrinha azul até a barrinha vermelha). De qualquer forma, uma fração ínfima da população.

Em suma, o PT está propondo uma grande redução nos impostos pagos pelos mais ricos, junto com um aumento nos impostos sobre um grupo ínfimo de muito ricos.

Mais leitura:

– Além de falar sobre a proposta neste post, discuti a política por trás da proposta aqui.

Detalhe:

– A Proposta da Bancada do PT propõe as seguintes alíquotas marginais:
Até 3.390,00 – Isento
3.390,01 até 6.780 – 5%
6.780.01 até 10.170 – 10%
10.170,01 até 13.560 – 15%
13.560,01 até 27.120 -20%
27.120,01 até 108.480 – 30%
A partir de 108.480,01 – 40%

Como eu expliquei, essas são alíquotas marginais, a taxa efetivamente paga é menor. Por exemplo, quem recebe R$ 115 mil por mês não pagaria 40% de imposto, pagaria 26,7% (o mesmo percentual de acordo com a tabela atual).

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A esdrúxula proposta do PT sobre o IR e a política http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/14/a-esdruxula-proposta-do-pt-sobre-o-ir-e-a-politica/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/14/a-esdruxula-proposta-do-pt-sobre-o-ir-e-a-politica/#respond Thu, 14 Jan 2016 04:00:05 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=553 Como mostrei neste post, a proposta dos deputados do PT para alterar a tabela do Imposto de Renda a Pessoa Física reduz o imposto de renda cobrado para quem ganha até um pouco mais que R$ 100 mil por mês.

O líder do PT na Câmara Sibá Machado diz que as propostas estão sendo elaboradas desde maio de 2015 e aponta essa mudança na tabela do IR como o principal ponto de um conjunto de medidas para o desenvolvimento com justiça social.

A proposta ultrapassa os limites do ridículo: em nome da justiça social, beneficia os mais ricos e reduz drasticamente a arrecadação do imposto de renda em um momento em que investimentos e gastos sociais são cortados.

Eu sei, não vai passar. Mas isso não é motivo para deixarmos o assunto de lado. Explico esse ponto de vista levantando duas perguntas:

1. A proposta parece oferecer uma chance de ouro para a oposição criticar o PT. Por que a oposição está tão quieta?

2. Por que o PT apresentou uma proposta tão esdrúxula?

Vicente Cândido, o deputado do PT que apresenta a proposta no site, é sócio de Marco Polo Del Nero, da CBF, um dos vilões do momento. A proposta dá um ganho para quem recebe R$ 70 mil por mês de uns dois salários mínimos mensais e, enquanto isso, o governo corta os benefícios sociais.

Que político perderia a chance de criticar uma proposta dessas?

Ainda assim, não vejo a oposição gritando sobre isso. Alguém viu?

Pode ser só incompetência da oposição. Pode ser que os políticos estejam em férias e os assessores brincando no joguinho do telefone.

Mas veja: se alguma coisa muito menos esdrúxula viesse da presidente, a oposição cairia em cima.

Imagine se a Dilma dissesse que vai dar um abono anual de R$ 5 mil para os assalariados que ganham R$ 50 mil mensais. A oposição estaria quieta? Essa proposta dá quase R$ 30 mil anuais para quem tem essa renda.

Ou, imagine que o PSDB propusesse esse abono anual para os ricos. Será que o PT estaria falando alguma coisa?

Isso tudo me leva a especular sobre possíveis razões para o silêncio ensurdecedor da oposição.

Hoje, o jogo da oposição é contra o governo, pelo impeachment. Mas PT e governo são coisas diferentes.

É claro que o governo será contra essa proposta bizarra do PT.

O governo entende que estamos precisando ajustar as contas públicas. Podemos questionar a forma e a velocidade do ajuste, mas é fato que as medidas que o governo tem tentado aprovar visam reduzir o déficit, não expandi-lo.

Ao ajudar a matar essa proposta, a oposição poderia estar ajudando o governo em uma disputa interna. Talvez a oposição prefira deixar o governo com esse fogo amigo. Será?

Será que o que eles tem em mente é algo como “a proposta não vai passar, mas o governo que se enfraqueça com esse problema interno”?

 

Sobre os motivos do PT para essa proposta, das duas uma: ou os deputados do PT de fato queriam reduzir o IR para quem ganha R$ 80 mil por mês, ou nem se deram ao trabalho de calcular o impacto dessa proposta na qual eles estão trabalhando desde maio.

Qualquer que seja a resposta, é difícil acreditar que a proposta seja para valer.

É quase impossível acreditar que eles tenham feito as contas e concluído “ficou ótimo, é isso mesmo que o Brasil precisa nesse momento de ajuste fiscal!”

Só posso concluir que os deputados do PT elaboraram a proposta sem considerar seriamente o que de fato aconteceria se ela fosse implementada.

E, de fato, para que pensar no que aconteceria?

Um deputado do PT, por mais tosco que seja, sabe que o governo não vai aceitar essa mudança na tabela do Imposto de Renda. Um corte dramático no IR está fora de questão.

Então, mais uma vez, o PT parece estar jogando para a torcida, sem se preocupar com a realidade.

Uma jogada estranha, mas veja:

O site do PT pergunta ao líder Sibá Machado: “vocês acreditam em uma possível resistência da oposição?” Sibá Machado diz que não, “não tem por que ficar contra a isenção da classe trabalhadora, atender à classe média.”

No site do PT, a proposta beneficia os trabalhadores e a classe média, mas a oposição, sempre contra os trabalhadores, é o obstáculo potencial à proposta.

No mundo real, o primeiro obstáculo à proposta seria o governo — e com razão!

Alguém não sabe disso?

Os frequentadores do site do PT aplaudem a proposta. Por exemplo, o presidente da Federação dos Sindicatos da Administração Tributária dos Estados, Distrito Federal e União declara no site apoio total da entidade à proposta, citando sua “justiça tributária com a observação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva.”

Então talvez os deputados estejam esperando que a medida melhore a imagem deles junto aos apoiadores do PT de “classe média” (assalariados e funcionários públicos que ganham de R$ 5 mil para cima).

Essa explicação pressupõe que eles esperam que a torcida do PT não compreenda ou não vá muito a fundo nos impactos da proposta. E que não entenda que esses são os 10% mais ricos do Brasil. Ou que não queira entender. Pode ser mesmo.

Isso tudo explicaria porque agora não aparece alguém do PT defendendo a proposta. A ideia seria só jogar para a torcida do partido, sem de fato discutir o assunto. É janeiro, o público geral não vai prestar tanta atenção, a oposição vai deixar passar batido…

O problema é que esse surrealismo da nossa discussão sobre política econômica acaba se traduzindo em políticas econômicas desastrosas.

Essa proposta esdrúxula nos dá uma chance de apontar o surrealismo da discussão sobre política econômica no Brasil e, assim, trazê-la mais próxima da realidade.

Por isso, eu cobro explicações do PT. E gostaria que a oposição se manifestasse.

Mais leitura:

– Falo sobre a proposta neste post e dou mais detalhes neste post.

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A proposta do PT de reforma do Imposto de Renda http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/11/a-proposta-do-pt-de-reforma-do-imposto-de-renda/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/11/a-proposta-do-pt-de-reforma-do-imposto-de-renda/#respond Mon, 11 Jan 2016 04:00:11 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=534 Um grupo de deputados do PT apresentou recentemente ao governo um conjunto de propostas para “a retomada do desenvolvimento econômico com justiça social”.

Desse conjunto de propostas, o site do PT destaca a alteração na tabela do Imposto de Renda para Pessoas Físicas. Focarei nisso também.

O deputado Vicente Cândido (PT-SP) explica que a reforma está “em busca da justiça tributária”, pois hoje os impostos são “maiores sobre a classe média e sobre os trabalhadores”.

A mudança na tabela do IR geraria uma grande redução no imposto de renda das pessoas. O gráfico abaixo mostra a redução na taxa do imposto de renda devido, em pontos percentuais, para cada nível de renda (para o imposto pago para cada nível de renda, veja este post).

irpf-PT

Para quem ganha até R$ 1900 por mês, a proposta não faz diferença nenhuma.

Quem ganha R$ 5 mil por mês, pagaria 8,5% a menos. Quem tem salário mensal de R$ 10 mil deixa de pagar 18,8% e passa a pagar apenas 4,9%. Quem leva R$ 20 mil por mês deixa de pagar 23,2% e passa a pagar 11,5% (o IR cai pela metade).

Os trabalhadores que recebem R$ 40 mil por mês também se beneficiam da nova proposta: ao invés dos atuais 25,3%, passam a pagar 19%. Para o pessoal da classe média que leva R$ 80 mil mensais de salário, o ganho é de pouco menos de 2 pontos percentuais (mas esse ganho é maior que a renda da maioria da população).

Perde quem ganha mais que R$ 115 mil mensais. Os ricos! Eis a justiça social da proposta.

A proposta é bizarra mas ilustra um ponto que precisamos esclarecer: os ricos somos (muitos de) nós.

De acordo com o censo do IBGE de 2010, cerca de 74% das pessoas com algum rendimento recebiam menos que 2 salários mínimos. Os dados da receita federal indicam uma proporção ainda maior.

R$ 1900 é mais que 2 salários mínimos. Os mais pobres, a vasta maioria da população, têm renda inferior ao piso e não pagam IR. A proposta do PT não os afeta diretamente.

Contudo, a proposta reduz bastante a arrecadação de impostos. Assim, ou mais impostos precisarão ser coletados ou menos serviços serão prestados à população. De qualquer maneira, os mais pobres pagariam parte da conta.

Assim, os mais pobres seriam negativamente afetados por essa proposta de justiça social do PT.

A classe média que se beneficia com a proposta equivale aos 25% mais ricos da população, com exceção de uma ínfima minoria de muito ricos.

A parcela com renda superior a R$ 115.000 equivale a menos de 0,1% da população com renda (dados da receita federal, de 2013). No debate político, os ricos são os outros.

Com base nos dados da receita federal, em 2013, pouco mais de 5% da população com renda declarou rendimentos totais superiores a R$ 6.780. Pouco mais de 2% da população recebeu mais de R$ 13.560.

É difícil estimar quanta renda está no setor informal e é sonegada, então não sabemos exatamente quanto ganham os 5% ou 10% mais ricos. Ainda assim, a implicação dos dados é inescapável: a chamada classe média é a real classe alta.

Sindicatos de trabalhadores que ganham R$ 5 mil ou R$ 10 mil visam defender os direitos de seus associados, que estão dentre os 10% mais ricos. Não há nada errado com isso, em princípio.

Partidos políticos podem escolher defender essa chamada classe média, mas não me venham com discursos inflamados sobre os ricos e poderosos, não se coloquem como os guardiões dos mais pobres. Isso seria ignorância ou hipocrisia.

Na campanha para a eleição de 2001 no Reino Unido, Tony Blair disse: “justiça para mim está concentrada em levantar a renda daqueles que não tem uma renda decente. Não é minha ambição assegurar que David Beckham ganhe menos dinheiro”.

Eu concordo plenamente.

Contudo, hoje em dia, está na moda falar sobre a renda dos 0,1% mais ricos. Nada contra olhar para esses dados, mas o foco pode acabar criando uma falsa sensação de que os ricos são os outros, quando os ricos somos (muitos de) nós.

Isso não gera apenas conversas bizarras em rodas de amigos da chamada classe média. Gera, também, propostas de políticas públicas concentradoras de renda em nome da “justiça social”.

Referências:

– Explico com mais detalhes os efeitos da proposta neste post.

– Discuto a política por trás da proposta neste post.

– A proposta com a nova tabela de alíquotas do IR está no site do PT. As alíquotas marginais de acordo com a proposta são maiores para aqueles que têm renda superior a R$ 27 mil, mas o percentual efetivamente pago só é maior para quem ganha mais que R$ 115 mil mensais.

– Os dados do IBGE estão aqui, mas parecem subestimar a renda dos mais ricos. Os dados da receita federal (aqui) fornecem uma indicação mais próxima da renda das pessoas.

– A citação à frase de Tony Blair está no artigo “Spend it like Beckham? Inequality and redistribution in the UK”, de Andreas Georgiades e Alan Manning, Public Choice (2012), 151: 537-563.

Detalhe:

– Outras mudanças no imposto de renda, além da mudança na tabela, seriam necessárias para que mais que 0,01% da população passasse a pagar mais impostos com a reforma tributária proposta. Uma reforma tributária mais ampla que mexesse nesse ponto seria muito bem vinda, mas esse é assunto para outro post.

 

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Além das boas ou más intenções http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2015/12/18/alem-das-boas-ou-mas-intencoes/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2015/12/18/alem-das-boas-ou-mas-intencoes/#respond Fri, 18 Dec 2015 14:05:05 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=469 Em sua coluna de ontem na Folha, Laura Carvalho argumenta que a política econômica do governo Dilma beneficiou o setor industrial e a Fiesp. Em suas palavras, “o setor empresarial foi o maior beneficiado pela expansão fiscal do primeiro governo Dilma Rousseff”.

Estaria então a colunista tardiamente reconhecendo que não devemos enxergar o PT como o defensor dos mais pobres?

De fato, muitas ações do primeiro governo Dilma Rousseff tiveram o efeito direto de beneficiar grandes grupos industriais.

A lei do conteúdo local, de dezembro de 2010, criou uma grande reserva de mercado para fornecedores nacionais de empresas como a Petrobrás.

Para tornar a vida desses empresários ainda mais fácil, o BNDES financiou muitos desses a taxas de juros bem inferiores às de mercado.

Aliás, a enorme expansão do BNDES direcionou crédito para as grandes empresas, o que tem um efeito negativo sobre a oferta de crédito para quem não tem acesso ao crédito subsidiado do BNDES (a maioria da população).

Vou então dizer que Dilma Rousseff tinha como objetivo a defesa do interesse dos mais ricos? Não.

Pelo menos em parte, no início, Dilma Rousseff e sua equipe realmente acreditavam que essas políticas seriam boas para o país como um todo.

Pelo menos em parte, o governo de Dilma de fato acreditava que a Nova Matriz Econômica estimularia a economia sem perder o controle da inflação; que a enorme expansão de crédito do BNDES promoveria o crescimento; que a lei do conteúdo local traria ganhos para a economia no médio e longo prazo.

Essas políticas não funcionaram. Para o país como um todo, foram muito ruins.

O desenvolvimentismo do primeiro governo Dilma foi um obstáculo ao crescimento da economia. A Nova Matriz Econômica foi um fracasso. As políticas monetária e fiscal empurraram parte do problema para o futuro. O futuro chegou em 2015.

É isso que precisamos aprender.

As divergências entre os que defendiam (e defendem) esse tipo de política e aqueles que, como eu, são contrários a elas não têm a ver com seus efeitos sobre ricos ou pobres.

Minha principal objeção a essas políticas é que elas são ruins para o país como um todo — não que elas beneficiam mais este ou aquele grupo.

O que está em jogo é o que é melhor para o país. Nenhum dos lados do debate tem o direito de ser visto como o defensor bem intencionados dos mais pobres, nem deve receber a pecha de mal-intencionado defensor dos ricos. Precisamos começar a discutir política econômica nesses termos.

O frustrante é que o governo e os defensores de suas malfadadas políticas têm logrado transformar esse debate sobre o que é melhor para o país como um todo em um embate entre poderosos e oprimidos (com o governo do PT ao lado dos oprimidos).

E muitos dos leitores da coluna de Laura Carvalho vão continuar pensando dessa maneira, mesmo depois de ler que a expansão fiscal do primeiro governo Dilma foi focada nos mais ricos.

Afinal, depois de uma coluna toda sobre os benefícios concedidos pelo governo do PT aos mais ricos (leia-se, aos membros da Fiesp), a colunista coloca a Fiesp ao lado dos maus (a CIA, o governo americano e os golpistas de 1964) contra o governo do PT.

A torcida do PT vibra com a comparação do apoio da Fiesp ao impeachment ao golpe militar de 1964. O PT é mais uma vez colocado como o inimigo dos mal intencionados.

O argumento tem a sofisticação intelectual de um grito de quem assiste futebol (“chupa!”) mas não é preciso mais que isso para dar munição aos torcedores da política.

Mais leitura:

– Para uma explicação mais completa sobre os efeitos dessas políticas sobre a economia como um todo, recomendo meu livro A Riqueza da Nação no Século XXI.

– Sobre o impeachment, não tenho nada interessante a acrescentar sobre o que já foi dito por colunistas como o Hélio Schwartsman (por exemplo, aqui).

– Sobre a Fiesp, escrevi algo neste post.

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