A Economia no Século 21BNDES – A Economia no Século 21 http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br O olhar de um pesquisador sobre a economia contemporânea Tue, 30 Aug 2016 15:06:40 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Adotamos políticas públicas ruins por ignorância ou maldade? http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/08/19/adotamos-politicas-publicas-ruins-por-ignorancia-ou-maldade/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/08/19/adotamos-politicas-publicas-ruins-por-ignorancia-ou-maldade/#respond Fri, 19 Aug 2016 05:00:23 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=1055 Com políticas públicas adequadas, o Brasil seria um país muito mais próspero. Bons governos nos países mais pobres teriam reduzido bastante a pobreza e o subdesenvolvimento.
Por que frequentemente adotamos políticas públicas ruins?

Pode ser culpa da ignorância. Eleitores apoiam e exigem políticas públicas que são de fato ruins para o país como um todo. Medidas adotadas pelos governos têm resultados negativos inesperados.
Alternativamente, pode ser culpa da maldade. Interesses escusos direcionam as políticas públicas para beneficiar uns poucos à custa da maioria.

Tomando um exemplo concreto, considere a atuação do BNDES no governo de Dilma Rousseff.

A meu ver, essa foi uma política desastrosa. Gastar mais do que o custo do Bolsa Família em subsídios para realocar crédito é um péssimo uso dos recursos públicos. Por que o BNDES agiu dessa forma?

Se a culpa é da ignorância, o motivo é que muita gente acha (ou achava) importante o governo fornecer crédito a taxas de juros inferiores às do mercado para fomentar o desenvolvimento da indústria nacional.

Se a culpa é da maldade, os empréstimos subsidiados do BNDES existiram para encher os bolsos de alguns, todos sabiam que essa intervenção não fazia sentido.

Suponha, porém, que eu esteja enganado e a atuação do BNDES no governo de Dilma Rousseff tenha estimulado o desenvolvimento econômico do país. Nesse caso, por que há oposição à atuação do BNDES?

Novamente, se a culpa é da ignorância, o motivo é que pessoas como eu não entendem alguma coisa importante.

Se a culpa é da maldade, quem se opõe ao BNDES está defendendo o capital internacional, os rentistas, a subserviência nacional aos interesses do grande capital.

A meu ver, a ignorância é a maior culpada.

Se o BNDES fez maravilhas pelo Brasil e minhas críticas estão incorretas, é porque sou burro, não porque sou mau —e isso se aplicaria a muitos outros economistas.

Se eu estou certo e a atuação do BNDES foi um desastre, cabe então perguntar por que não havia mais oposição a esses empréstimos subsidiados.

A maldade não é inocente. Muita gente ganhou dinheiro com os juros altamente subsidiados do BNDES e financiou campanhas.

Só que empresário querendo empréstimos a juros baratos não é privilégio do Brasil. A diferença é que aqui há um pensamento (de esquerda) que justifica esses subsídios.

Muitos professores de economia espalhados pelo Brasil acham (ou achavam) que esse tipo de política pública beneficiaria o país. Era impopular na campanha criticar a atuação do BNDES. Muitas premissas na qual a atuação do BNDES se baseava ainda são aceitas pela maioria.

Economistas que defendiam a política econômica do governo até pouco tempo atrás ou insistem no erro ou já vieram com novas soluções baseadas nas mesmas velhas premissas. Até onde posso julgar, esses economistas de fato acreditam no que falam.

Foi por achar que o debate sobre economia está mal informado que eu resolvi contribuir para a discussão no blog da Folha e na coluna. Foi um ano, espero que tenha sido útil. Vou com o blog até o fim do mês, esta é a última coluna no jornal impresso. Muito obrigado pela atenção.

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Subsídios a investimentos afetam o nível de investimentos? http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/05/subsidios-a-investimentos-afetam-o-nivel-de-investimentos/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2016/01/05/subsidios-a-investimentos-afetam-o-nivel-de-investimentos/#respond Tue, 05 Jan 2016 04:00:44 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=516 Suponha que o governo institua subsídios a um grupo de pessoas para a compra de estátuas de gesso. Por conta dos subsídios, essas pessoas passam a demandar mais estátuas.

Esse aumento na demanda gera mais oportunidades para os produtores, que aumentam a oferta de estátuas de gesso. A política de subsídios, portanto, estimula a produção de estátuas.

Agora, se o subsídio for para a compra de estátuas de artistas falecidos, a oferta não pode reagir.

O subsídio aumenta a demanda. Como a oferta não se modifica, o preço sobe. As estátuas ficam efetivamente mais baratas para quem tem acesso aos subsídios, mas mais caras para os que não têm acesso.

Assim, o subsídio leva a um aumento no preço das estátuas e a uma realocação: algumas estátuas passam para as mãos de quem recebe os subsídios. Mas não muda a quantidade total de estátuas, porque a oferta de estátuas produzidas por Aleijadinho não reage a mudança nos preços.

Agora, os subsídios dos empréstimos do BNDES.

A Folha noticiou nesse fim de semana que o governo encerrou o bilionário Programa de Sustentação de Investimentos (PSI), um programa de empréstimos altamente subsidiados para um grupo seleto de empresas e pessoas.

O governo não cria recursos do além. Para os propósitos desse post, podemos pensar nas operações do PSI como subsídios ao crédito específicos a certas pessoas ou empresas.

A Folha também noticiou que as “empresas dizem que o crédito do BNDES propiciou mais investimento” para quem recebeu o crédito subsidiado.

Isso não é nada surpreendente. Assim como o subsídio aumenta a demanda por estátuas de gesso no exemplo desse post, o PSI leva a uma maior demanda por empréstimos.

Em parte, esses empréstimos podem ser simplesmente emprestados de volta ao governo. Nesse caso, a empresa basicamente toma emprestado do governo a 5% e empresta a 12% para o próprio governo. Um belo negócio para a empresa — e um péssimo negócio para quem paga impostos.

Mas parte desses empréstimos de fato deve ser direcionada ao investimento em máquinas e equipamentos. Assim, o crédito subsidiado deve efetivamente levar a mais investimento das empresas agraciadas com o PSI.

Assim como subsídios a estátuas aumentam a demanda por estátuas, crédito subsidiado aumenta a demanda por crédito.

Contudo, para que esse aumento na demanda de fato gere mais investimentos na economia como um todo, e não simplesmente uma realocação nos investimentos para quem tem acesso ao PSI às custas de quem não tem, é preciso que a oferta reaja.

Quem produz as estátuas de gesso nesse caso?

O mercado financeiro liga quem tem recursos a quem quer investir das mais diversas formas. Os bancos nada mais são que intermediários nas operações financeiras. O dinheiro que um banco toma emprestado de um é emprestado para outro.

No mercado financeiro, a demanda por crédito vem de quem quer investir. O subsídio aumenta a demanda.

No lado da oferta, quem “produz as estátuas” é quem deixa de consumir e poupa (“poupar” aqui significa investir no mercado financeiro, não necessariamente na caderneta de poupança).

Se a demanda por crédito aumenta, os juros sobem. Essa alta nos juros pode estimular as pessoas e empresas a consumir menos e poupar mais. Se mais dinheiro é poupado, há mais oferta de crédito para quem quer tomar emprestado.

Então, a pergunta é: quão fortemente a oferta de crédito reage a juros mais altos? Quanto as pessoas deixam de consumir e passam a poupar por conta de taxas de juros mais altas?

Empiricamente, essa pergunta não tem resposta clara. É difícil estimar, mas o efeito parece ser pequeno.

À primeira vista, pode parecer estranho que taxas de juros mais altas não levem as pessoas a poupar mais, mas isso é menos estranho que parece. Explico com um exemplo.

Uma taxa de juros de 4% ao ano multiplica seu dinheiro por 4 em 35 anos. Uma taxa de juros de 5% ao ano multiplica seu dinheiro por 5,5 no mesmo período.

Deveríamos esperar que quem poupa para a velhice consumisse menos e poupasse mais no caso de juros de 5% ao ano?

– Por um lado, com juros mais altos, poupar mais fica mais atrativo por conta do maior retorno.

– Mas por outro lado, é preciso poupar menos para garantir um certo padrão de vida na velhice.

Qual efeito é o mais forte? Não é claro. As lições desse exemplo se aplicam a uma gama maior de situações. O ponto é que a oferta de crédito (a poupança) parece reagir relativamente pouco à taxa de juros.

Em suma, por conta do crédito subsidiado, algumas empresas demandam mais crédito e investem mais. Contudo, para que haja mais investimento na economia como um todo, é preciso que a oferta de crédito aumente. Alguém precisa produzir mais estátuas.

A oferta não parece reagir fortemente a taxa de juros. Assim, não é claro que os enormes subsídios ao crédito levem a um aumento relevante do investimento da economia como um todo.

O que é claro é que o crédito subsidiado causa uma realocação de recursos na economia: a taxa de juros fica mais baixa para quem tem acesso ao crédito subsidiado, mas mais alta para os outros.

Mais leitura:

– Eu expliquei o efeito das operações do BNDES na taxa Selic sob uma outra ótica neste post.

– Eu discuto os efeitos dessa realocação do crédito no meu livro A Riqueza da Nação no Século 21.

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Juros altos? Culpe o BNDES, não o BC. http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2015/10/21/juros-altos-culpe-o-bndes-nao-o-bc/ http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/2015/10/21/juros-altos-culpe-o-bndes-nao-o-bc/#respond Wed, 21 Oct 2015 08:05:24 +0000 http://f.i.uol.com.br/folha/colunas/images/15246248.jpeg http://aeconomianoseculo21.blogfolha.uol.com.br/?p=235 Mais uma reunião do Copom, o Banco Central decide hoje se mexe na taxa Selic, uma das taxas básicas de juros na nossa economia. A taxa Selic é muito maior que a taxa de juros básica vigente na grande maioria dos países. Isso afeta negativamente a economia brasileira.

Esquece-se, porém, que temos também uma taxa básica de juros muito baixa na economia, a TJLP, que baliza os empréstimos às empresas agraciadas com o crédito subsidiado do BNDES.

Se tivéssemos apenas uma taxa básica de juros, ou seja, se o governo não emprestasse rios de dinheiro a taxas muito inferiores à que o próprio governo paga em sua dívida, teríamos uma taxa Selic menor sem que isso prejudicasse o controle da inflação.

Vou explicar.

O Banco Central controla a taxa de juros básica da economia, a Selic. Quando a taxa básica de juros está mais alta, investir em títulos públicos se torna mais atraente, então quem quiser tomar empréstimos precisa pagar juros mais altos. Assim, a decisão sobre a taxa de juros do Banco Central afeta o custo do crédito em toda a economia.

O Banco Central mexe no custo do crédito para influenciar as decisões de consumo e investimento. Se o crédito fica mais caro, há menos incentivos para investir e comprar a prazo. A taxa de juros mais alta tende, portanto, a afetar negativamente o consumo e o investimento.

Se as pessoas e empresas querem comprar menos, há menos demanda na economia. Assim, as empresas precisam vender os produtos a preços mais baixos. Além disso, as empresas vão acabar vendendo menos, o que leva a um menor nível de produção na economia.

Assim, a alta da taxa de juros pelo Banco Central tende a reduzir o produto da economia e os preços. Juros mais elevados ajudam a segurar a inflação, mas prejudicam o desempenho da economia.

O Banco Central manobra a taxa básica de juros para manter a inflação no nível desejado. Se o Banco Central deixa os juros em um nível mais baixo que deveria, sobe a inflação.

Esse efeito foi testado recentemente. No primeiro mandato de Dilma, o governo promoveu uma grande queda na taxa Selic para estimular a economia. Era a “Nova Matriz Macroeconômica”, apresentada na época pelo Ministro Mantega como uma grande inovação na política macroeconômica brasileira.

Como esperado, a inflação subiu. Para que a inflação oficial não refletisse esse aumento, o governo segurou o aumento dos preços administrados (os que o próprio governo controla). Uma espécie de “pedalada monetária”. Parte da inflação de 2015 reflete essa inflação escondida em anos anteriores.

Em suma, o BC não pode deixar os juros abaixo de um certo nível sem comprometer o controle da inflação.

Então, a pergunta importante é: por que os juros têm que ser tão altos no Brasil para que a inflação não aumente?

O BNDES é parte da resposta.

O BNDES fornece crédito a taxas muito inferiores à Selic para os mais diversos fins, por exemplo: nos últimos dez anos, o BNDES financiou diversos investimentos para construir ou renovar estaleiros, estimulando a indústria naval com juros baixos; há poucos anos, financiava a compra de caminhões a juros nominais de 3% ao ano (muito menos que a inflação); etc.

A expansão de crédito pelo BNDES tem efeitos sobre o investimento, mas também sobre a inflação, assim como qualquer outra expansão de crédito.

Por vezes, a discussão sobre política econômica parece supor que a taxa Selic (a que o BC escolha) afeta a inflação e o investimento, mas que o crédito do BNDES só afeta o investimento, não tem impacto sobre a inflação. Essa distinção não faz sentido algum!

Se o BNDES expande o crédito, o BC precisa induzir uma contração no crédito na economia (subir os juros) para que a inflação fique no patamar desejado. Se o BNDES contrai o crédito, o BC pode induzir uma expansão no crédito (baixar os juros), sem que isso afete o total de crédito na economia e, portanto, sem que isso afete o controle da inflação.

Dizendo de outra maneira, ao financiar a construção de navios, o BNDES está estimulando a demanda por bens na economia. Para que a demanda fique no patamar que não leva ao aumento da inflação, o BC precisa compensar esse estímulo. Assim, é preciso uma taxa de juros maior para desestimular o investimento e o consumo.

Se os investimentos financiados BNDES a juros subsidiados não existissem, poderíamos ter mais crédito para a economia a taxas de mercado. Isso significa que teríamos juros mais baixos.

Temos no Brasil mais de uma taxa básica de juros. Nos últimos anos, a TJLP anda abaixo da inflação e o BNDES tem expandido muito o crédito, sem se preocupar com a inflação. Sobra ao BC a tarefa de contrair o crédito para compensar o efeito das operações do BNDES.

Lê-se nos jornais que esse ano, o BNDES está emprestando menos dinheiro esse no ano passado. É verdade, mas continua emprestando muito e o estoque de crédito do BNDES continua altíssimo, bem mais que 20% do estoque de crédito no Brasil.

Fala-se que o BNDES custa muito aos cofres públicos porque empresta a taxas de juros muito menores que as que remuneram a dívida do próprio governo. É verdade e esse custo é muito alto. Mas o problema não para por aí.

O BNDES também causa um aumento na taxa de juros paga na dívida pública — e na taxa de juros paga por pessoas e empresas que não tem acesso ao crédito subsidiado.

Referências:

– A matéria “O Banco Camarada” de Consuelo Dieguez, publicada na Revista Piauí, 109 (outubro de 2015), traz informações muito interessantes sobre as operações do BNDES.

– Parte da explicação sobre o BC e o BNDES foi adaptada de meu livro “A Riqueza da Nação no Século 21“. Aqui, eu foquei no efeito sobre a taxa de juros, mas o livro traz uma explicação mais completa sobre os efeitos do BNDES na economia e sobre a política monetária.

Detalhe:

– Há casos em que juros mais altos podem não ajudar a segurar a inflação. Eu mesmo já escrevi sobre isso (o trabalho é “Monetary policy, default risk and the exchange rate”, co-autorado com Carlos Eduardo Gonçalves, publicado na Revista Brasileira de Economia em 2011). Mas para isso acontecer, o risco de calote na dívida pública precisa ser suficientemente grande.

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