O trecho na abertura das Olimpíadas sobre o aquecimento global foi mais um na longa série de eventos para conscientizar as pessoas sobre a necessidade de preservar o meio ambiente.
O problema, em linhas gerais, é que a Terra tem uma capacidade escassa para assimilar poluição sem que isso prejudique a nossa vida no planeta.
As crianças aprendem isso na escola. (Quase) todo mundo entende.
De acordo com pesquisa do Ibope (de 2012, foi a que eu achei), 94% da população brasileira está preocupada com o meio ambiente; 93% acredita que a temperatura da terra está aumentando; 65% considera o problema do aquecimento global urgente; 55% afirma que todos os países – ricos e pobres – devem contribuir igualmente para a redução do aquecimento global. Quando a pergunta é “O que priorizar quando houver conflito entre a proteção do meio ambiente e o crescimento econômico”, o meio ambiente ganha fácil, 44% a 8%.
Ainda assim, não temos progredido muito na questão. Continua-se então culpando os governos que não fazem o que deveriam (o quê?) e vamos assistindo a mais eventos e manifestações para conscientizar a população.
A nossa incapacidade de resolver esse problema de escassez contrasta com a nossa capacidade de lidar com o problema da escassez cíclica de morangos (entre zilhões de outros exemplos).
Todo ano, há muito menos morangos disponíveis para o nosso consumo em abril do que em outubro. A diferença é grande. Mas isso não causa problema algum: nós nos adaptamos e consumimos muito menos morangos em abril, muito mais em outubro. Funciona perfeitamente.
Curiosamente, não há programas para nos conscientizar da necessidade de sermos mais parcimoniosos no nosso consumo de morango. Não há eventos explicando que não somos capazes de produzir tanto morango em abril, que precisamos conter nossos desejos consumistas.
O que acontece é que o preço do morango é muito maior em abril. Aí, uns compram morango e pagam mais. Outros substituem o consumo de morango pelo de outras frutas.
É o sistema de preços que nos avisa sobre a escassez relativa de cada produto e que mantem os produtores informados sobre as nossas demandas.
Como um incansável mensageiro, o sistema de preços vai agindo sobre as demandas e ofertas de bens na economia, direcionando os esforços de produção da sociedade para o que nós queremos consumir e as nossas demandas para o que é menos custoso produzir.
O sistema de preços nos avisa que produzir smartphones é muito mais barato que há uma década (então, consumimos mais), nos faz incorporar quedas de safras em nossas demandas, informa aos ingressantes no mercado de trabalho, por meio dos salários dos mais diversos profissionais, os tipos de trabalho mais demandados, etc.
Assim, o sistema de preços resolve o problema da alocação de morangos escassos — e de mais zilhões de outras coisas.
Só que o sistema de preços não é perfeito.
Os custos da produção ou consumo de algo que não incidem diretamente sobre quem produziu ou consumiu não são captados pelos preços das coisas.
Por exemplo, quando queimamos combustíveis fósseis, poluímos o planeta. Só que esse custo, a poluição, não é arcado por quem queimou, mas por toda a sociedade. A poluição que cada um de nós causa quando usa o carro não torna nossa viagem mais cara. Os poluentes emitidos pelas empresas não impactam seus custos de produção.
Portanto, essa poluição não é captada pelo sistema de preços.
Assim, continuamos sem resolver o problema da escassez de capacidade da Terra absorver poluição.
A solução para esse tipo de problema foi formalmente apresentada por Arthur Pigou em 1920. A ideia básica é simples: devemos incluir esses custos que não incidem diretamente sobre o produtor ou consumidor no sistema de preços.
No caso particular, devemos incluir os custos de queimar combustíveis fósseis no preço pago pelo consumidor ou produtor (dá no mesmo). Isso se chama imposto.
Para cobrir seus gastos, o governo taxa a produção de bens, o trabalho e uma série de outras coisas. Ao tornar mais caro comprar um bem ou pagar um funcionário, esses impostos desincentivam a produção e o trabalho no setor formal — não porque assim queremos, mas porque impostos desincentivam justamente o que gera a base da arrecadação.
Em geral, isso é um problema.
Só que a emissão de poluentes e o trânsito de veículos em cidades congestionadas são coisas que nós de fato queremos desestimular. Então devemos taxar.
E aí, algumas pessoas e empresas vão, aos poucos, reduzir sua demanda por combustíveis. O preço mais alto cria incentivos para consumidores buscarem produtos e serviços que requerem menos queima de combustíveis fósseis. Tecnologias alternativas passam a ser mais atrativas.
E quem quiser queimar combustível poderá fazê-lo sem culpas, pois estará pagando pelo dano causado ao meio ambiente.
O imposto sobre combustíveis é um bom imposto.
Se você acha que temos impostos demais, deve defender que a introdução desses impostos seja acompanhada da redução de outros. Mais pedágio urbano e impostos sobre combustíveis, menos impostos sobre a produção de bens e serviços (ICMS, IPI, ISS, COFINS…).
Se você é particularmente preocupado com a ecologia, deve defender altíssimos impostos sobre o combustível e um pedágio urbano salgado.
No momento, quase todo mundo está preocupado com o meio ambiente. Ao mesmo tempo, a grande maioria da população parece ser contra a proposta de pedágio urbano; a Cide (o imposto sobre os combustíveis) é impopular; a redução do IPI sobre os carros em 2009 foi saudada por muitos.
Não falta conscientizar as pessoas sobre a necessidade de preservar o meio ambiente.
Falta apoio a ações concretas que façam a geração de poluição custar aos nossos bolsos.
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– Detalhe: a evidência disponível sugere que um imposto sobre os combustíveis de fato tem efeito bem pequeno no curto prazo, mas parece ter um efeito bem maior no longo prazo, por incentivar o desenvolvimento de tecnologias alternativas. Tratei disso neste post.