Imigração no Reino Unido

Por Bernardo Guimarães

No dia 28 de abril de 2010, uma semana antes das eleições gerais para o parlamento britânico, o candidato trabalhista e então primeiro ministro Gordon Brown foi conversar com uma eleitora, Gillian Duffy, da região de Manchester.

Na conversa, Gillian Duffy disse a Gordon Brown: “Você não pode falar nada sobre os imigrantes porque aí é como dizer que você é… mas todos esses imigrantes do Leste Europeu que estão vindo, de onde eles vêm?”

A conversa entrou para a história porque Gordon Brown esqueceu de tirar o microfone pregado à sua roupa quando entrou no carro e, comentando a conversa com sua equipe (“que desastre”), se referiu à eleitora como “uma mulher preconceituosa” (a bigoted woman).

Assim caminhávamos em 2010, assim continuamos caminhando: a população incomodada com o fluxo migratório não se sentia confortável para expor suas opiniões, pois boa parte da elite cosmopolita reagia com desprezo a qualquer sinal de incômodo com os imigrantes.

6 anos depois, na última 5a feira, a preocupação com a migração de estrangeiros para o Reino Unido foi um fator crucial para o resultado do referendo britânico sobre a permanência na União Europeia.

Essa preocupação faz algum sentido ou é fruto do preconceito e da ignorância?

O livro Exodus, de Paul Collier, busca explicar o que se sabe sobre o efeito da migração sobre os próprios migrantes e sobre os países que os recebem, mencionando, sempre que possível, dados e trabalhos acadêmicos.

Um ponto importante destacado no livro é que migração aumenta a diversidade de uma população e, Collier argumenta, isso tem efeitos positivos e negativos. Um efeito negativo é que, com frequência, esse aumento na diversidade reduz a coesão social. Esse ponto é apoiado em pesquisa acadêmica respeitada.

Uma das conclusões do livro é que migração moderada é benéfica, mas migração rápida pode afetar negativamente a população local. Ele defende que o processo de migração seja controlado.

Há alguns anos, ele vem argumentando que seria desejável reduzir o ritmo de migração para o Reino Unido, até para facilitar o processo de assimilação dos imigrantes no país e assim evitar uma maior oposição à migração. Esse seu artigo de jornal de 2014 hoje merece o subtítulo “eu avisei”.

A preocupação com o processo de assimilação dos imigrantes está na pauta das discussões políticas no Reino Unido há anos.

Hoje, para se naturalizar britânico (e até para conseguir residência permanente), uma pessoa deve fazer uma prova (“Life in the UK”) para entender um pouco da cultura e das instituições do país.

O pequeno livro que prepara para a prova ensina os santos de cada uma das nações do Reino Unido (St John, St Andrews, St George e St Patrick para o País de Gales, Escócia, Inglaterra e Irlanda do Norte, respectivamente), mas também explica que no país há um parlamento escolhido por eleições (e descreve o funcionamento do parlamento), que é comum as crianças receberem mesada (pocket money) e os jovens saírem à noite desacompanhados dos pais.

Para muitos imigrantes, isso é tudo novidade. Não deve ser fácil a tal assimilação dos imigrantes.

O último passo para a naturalização é uma cerimônia simples e rápida, que respeita as diferenças de origem de cada um. Quem vai se naturalizar promete lealdade ao Estado britânico. Você pode escolher jurar por Deus ou uma forma não-religiosa para a promessa. Antes disso, cada pessoa fala seu nome para que todos se sintam acompanhados na cerimônia, cada um numa língua mais diferente. No final, recebe-se o certificado. E os novos britânicos podem curtir o país numa boa.

Assim, muitas pessoas com culturas muito diferentes são bem recebidas e se instalam no Reino Unido. Muitos guetos acabam se formando. Muitos locais se sentem incomodados.

O que fazer a respeito?

Hoje, muitos de nós lamentam a saída do Reino Unido da União Europeia. Há muito a se criticar sobre o processo (ver, por exemplo, esse artigo de Kenneth Rogoff), e é comum a opinião de que a população votou mal informada.

Mas a reflexão não pode parar por aí.

Parte do pessoal cosmopolita continua tachando os incomodados com a imigração de xenófobos, racistas e ignorantes. Muitos pesquisadores sérios acreditam que a população local tem motivos para se opor a um ritmo rápido de migração. Quem sabe é a parcela cosmopolita da população que está julgando os locais de maneira preconceituosa e deveria tentar entendê-los melhor.