Ministério da Cultura: uma oportunidade desperdiçada

Por Bernardo Guimarães

O maior desafio do novo presidente é colocar a economia brasileira nos trilhos. Isso requer ajustar as contas públicas para evitar um crescimento explosivo da dívida.

Esse ajuste é muito complicado em uma recessão, pois a arrecadação de impostos é menor e aumentar impostos nesse momento torna ainda mais difícil a recuperação.

Se o novo governo conseguisse transmitir confiança aos investidores e, assim, atrair investimentos, a tarefa seria menos complicada por dois motivos: esse aumento no investimento e na produção teria um efeito positivo na arrecadação (menos cortes seriam necessários); e o consequente aumento no nível de emprego colaboraria para a popularidade do novo governo e, assim, reduziria a oposição às reformas.

Então, como transmitir confiança?

O governo precisa convencer os agentes econômicos que será capaz de aprovar uma série de medidas econômicas que implicam em gastos públicos menores e/ou impostos maiores. Muita gente vai reclamar.

Portanto, para transmitir confiança, o presidente precisa mostrar que será capaz de suportar pressões de vários grupos e de angariar algum apoio da opinião pública.

A questão do Ministério ou Secretaria da Cultura é pouco relevante. Em princípio, a mudança poderia ser só uma troca de nome. Só que Michel Temer poderia ter usado esse episódio para transmitir confiança.

Usando a terminologia de teoria dos jogos, a chiadeira contra a extinção do Ministério da Cultura deu ao presidente a oportunidade de “sinalizar seu tipo”, ou seja, deu-lhe a chance de mostrar que teria condições de suportar pressões e ditar a agenda.

Por exemplo, me parece que seria fácil para o governo olhar os orçamentos dos ministérios e:

(1) Achar algum motivo pelo qual faria sentido ter o Ministério da Cultura junto com o da Educação. Alguma secretaria ou órgão com função parecida nos dois ministérios, ou alguns programas que poderiam ser combinados, alguma sinergia, qualquer coisa. Qualquer coisa que pudesse ser usada para argumentar que a mudança será benéfica (mesmo que depois alguém pudesse apontar contra argumentos).

(2) Achar algum gasto que pode ser cortado, algum incentivo que pode ser modificado (talvez por algum tempo), alguma coisa que signifique uma economia de recursos e que a maior parte da população seja a favor (claro que alguns vão chiar, é preciso aguentar).

(3) Achar algum gasto que foi cortado, algum programa que não foi executado pela gestão anterior, qualquer coisa que custe menos que o que será cortado (o item 2) e pareça um melhor uso de recursos.

Por exemplo: seria reduzido o incentivo fiscal a grandes empresas (ou bancos!) que financiam eventos direcionados aos mais ricos (com ingressos caros); aumentaria o incentivo fiscal para algum tipo de projeto de arte com entrada franca. No total, o país economizaria um troco.

Os jornais trariam os argumentos dos Ministros ou Secretários com números e exemplos que quase ninguém conhece ou tem acesso (ou paciência para olhar). Até alguém achar os dados, entender o assunto e estruturar um bom contra-argumento, levaria uma semana. Nesse tempo, o assunto já estaria esfriando e o debate ficaria restrito aos mais interessados.

A economia de recursos seria ínfima se comparada ao tamanho do ajuste, mas o governo conseguiria “sinalizar seu tipo”.

À opinião pública, o governo passaria a impressão de saber o que está fazendo e de estar buscando um ajuste fiscal razoável.

Aos mais cínicos (como eu), o governo passaria a impressão de conseguir suportar pressões e de ser capaz de trazer a opinião pública para seu lado. Investidores passariam a acreditar que o governo teria condições de fazer limonadas dos vários limões que ainda serão atirados quando medidas de ajuste forem propostas.

Ao invés disso, temos as piadas sobre o Ministério do Recuo.

A teoria dos jogos nos diz que quem não aproveita a chance para transmitir uma mensagem positiva efetivamente transmite uma mensagem negativa.

A implicação é que os agentes econômicos devem ficar um pouco mais céticos em relação à capacidade desse governo aprovar as medidas de ajuste.