Enquanto um novo governo se anuncia, especula-se sobre o que acontecerá com a esquerda política no Brasil. Mas o que é esquerda?
O termo deveria refletir um conjunto de princípios para a economia. O problema é que essa caracterização abrange questões econômicas muito distintas.
São classificadas como políticas de esquerda o direcionamento do crédito pelo BNDES, a lei do conteúdo nacional que limita a importação de equipamentos e aumentos de gastos públicos em momentos como o atual.
Essas políticas têm duas características importantes: a intervenção do governo na economia e o objetivo de melhorar a economia como um todo.
Na visão dos defensores dessas políticas, elas são melhores para o país como um todo (não para um grupo em detrimento do outro). Essas intervenções do governo na economia tornariam o Brasil mais próspero.
Na visão dos liberais, essas políticas são ruins para a economia como um todo, deixam todos nós mais pobres.
Há, porém, um segundo grupo de políticas de esquerda que inclui medidas como o Bolsa Família, tributação fortemente progressiva e o provimento pelo Estado de custosos serviços públicos focado nos mais pobres.
Essas políticas têm duas características importantes: a intervenção do governo na economia e o objetivo de transferir recursos dos mais abastados para os mais pobres.
No sentido do primeiro grupo de políticas, o governo Lula entre 2003 e 2005 foi mais liberal que de esquerda, enquanto o governo Dilma em seu primeiro mandato pendeu fortemente para a esquerda.
Além disso, o PT tem propostas de direita no sentido do segundo grupo de políticas (um exemplo é a proposta de mudança na tabela do Imposto de Renda divulgada pelo PT em janeiro).
Muito do discurso dos partidos de esquerda mistura as duas coisas, tentando defender o primeiro grupo de políticas intervencionistas como se o que estivesse em jogo fosse um embate entre pobres e ricos.
Há também um discurso da direita que empacota todas as políticas de esquerda em um mesmo grupo para desqualificá-las como um todo.
A intervenção do governo às vezes é benéfica, às vezes atrapalha. Não faz sentido escolher um desses pacotes fechados.
Podemos ser liberais no que diz respeito ao primeiro grupo de políticas, mas a favor da intervenção com fins distributivos.
De acordo com essa visão, o governo deve deixar o mercado funcionar mais livremente, o BNDES deve ter seu papel fortemente reduzido e o ajuste fiscal trará confiança aos investidores e beneficiará a economia; mas a intervenção direta do governo para transferir recursos aos mais pobres (em dinheiro e em forma de serviços públicos) é muito bem-vinda.
Muitos universitários hoje têm essa posição. São “liberais de esquerda”, defendem o “social-liberalismo”. Creio que muitos brasileiros se identificariam com essa bandeira se pudéssemos nos libertar dos rótulos “direita” e “esquerda”.
Boa parte do fracasso do governo Dilma é o fracasso de um modelo econômico intervencionista.
A esquerda precisa aceitar os seus erros, se reinventar e passar a apresentar propostas que realmente gostaria de implementar se estivesse no poder.
Assim, a esquerda passará a ser uma alternativa política viável.