Muito se especula sobre o efeito das notícias recentes sobre corrupção no comportamento do eleitor nas próximas eleições. Será que essas notícias terão impacto nas urnas?
Em maio de 2003, o governo deu início a um programa de auditoria dos gastos de governos municipais. As auditorias verificavam se havia corrupção e mau uso do dinheiro público.
Todo mês, alguns municípios passaram a ser sorteados para essa auditoria. Os resultados para cada município eram postados na internet e divulgados para a imprensa.
Em vários municípios, os auditores da CGU encontravam casos de superfaturamento, negócios da prefeitura com empresas fantasmas, recibos falsos, etc. Em outras cidades, não se encontravam casos de corrupção.
Essas auditorias oferecem aos pesquisadores uma oportunidade de verificar a reação dos eleitores às informações sobre os casos de corrupção.
Em trabalho publicado em 2008, Claudio Ferraz e Frederico Finan usam esses dados e uma estrátégia de estimação criativa para driblar os problemas comuns a trabalhos empíricos em ciências sociais.
A pergunta é a seguinte: como a informação sobre corrupção em uma cidade afeta a chance de reeleição do prefeito?
A auditoria realizada antes da eleição de 2004 nos traz informações sobre corrupção às quais o eleitor teve acesso; a auditoria realizada em 2005 nos traz as mesmas informações, mas essas chegam tarde demais para afetar a eleição.
Comparando municípios com casos de corrupção parecidos auditados antes e depois das eleições, podemos ver quão importantes são as informações reveladas pelas auditorias.
As técnicas estatísticas usadas no trabalho basicamente fazem essa comparação de modo sistemático e nos traduzem em números os efeitos médios dos casos de corrupção revelados pelas auditorias.
O trabalho de Ferraz e Finan mostra que em municípios com muitos (três ou mais) casos de corrupção, a auditoria reduz a probabilidade de reeleição do prefeito em cerca de 14 pontos percentuais.
Comparando duas cidades muito parecidas, ambas com muitos casos de corrupção, se a probabilidade de reeleição seria 50% sem a informação da auditoria, ela cai para 36% com a auditoria antes da eleição.
Esse efeito é grande. Afinal, as auditorias não devem ser a única fonte de informação sobre corrupção. Em geral, casos de corrupção devem despertar suspeitas. Além disso, nem todos os eleitores devem ficar sabendo do resultado da auditoria.
Por outro lado, mesmo a revelação de casos graves de corrupção não aniquila as chances de reeleição do prefeito. Não faltam exemplos de políticos corruptos reeleitos e isso não é diferente nas eleições municipais.
Não é fácil traduzir o significado desses resultados para o contexto de eleições nacionais, mas também não faz sentido descartar essa informação.
A evidência com dados de auditorias nas contas dos municípios mostra que o eleitor aprende com as notícias sobre corrupção e leva isso em conta em suas decisões.
A corrupção é apenas um dos vários determinantes do comportamento do eleitor, mas tem um efeito considerável nas chances de reeleições dos prefeitos.
Referência:
– Ferraz, Claudio and Finan, Frederico (2008), “Exposing Corrupt Politicians: The Effect of Brazil’s Publicly Released Audits on Electoral Outcomes”, Quarterly Journal of Economics 123, 703–745. O Quarterly Journal of Economics é um dos períodicos de maior prestígio na área de Economia.