Deb Roy, Professor do MIT da área de comunicação e mídia, montou uma espécie de Big Brother na casa dele. Ele instalou câmeras em diversos lugares para filmar seu filho aprendendo a se comunicar, desde o nascimento, a fim de entender melhor esse processo.
O gráfico abaixo mostra um resultado interessante de sua pesquisa. No eixo horizontal, o zero representa o mês que o menino aprendeu a falar uma certa palavra (por exemplo, “passear”). Cada número representa a quantidade de meses antes (se negativo) ou depois (se positivo) do menino ter aprendido a palavra.
No eixo vertical, temos uma medida de quão complexas são as frases dos pais que usam a tal palavra naquele mês.
O gráfico mostra que os pais vão falando de modo mais e mais simples até o momento que a criança aprende a palavra e, a partir daí, passam a falar de maneira mais e mais sofisticada.
Por exemplo, pense na criança aprendendo a palavra “passear”.
No início, muitos meses antes da criança falar qualquer coisa, os pais falam: “vamos passear com o papai e a mamãe no parque?”
Aos poucos, eles vão simplificando: “passear com papai e mamãe?”
E no momento que a criança está pronta para aprender a palavra, os pais falam algo simples como “passear?”, ao que a criança repete “passear”, aprendendo a palavra.
A partir daí, os pais começam a sofisticar de novo o diálogo, aos poucos.
Nas palavras do Professor Deb Roy, ao se comunicarem com o bebê, ele e sua esposa estavam “sistematicamente e, eu pensaria, subconscientemente reestruturando nossa linguagem para encontrá-lo no nascimento da palavra e trazê-lo aos poucos para uma linguagem mais complexa”.
Está bem, mas este não é o blog da Fabiana Futema. O que esse exemplo está fazendo aqui?
Essa é uma ilustração particularmente interessante de uma das hipóteses mais utilizadas nos modelos econômicos: a hipótese de escolhas racionais.
Em economês, uma escolha é racional se a pessoa buscou agir de acordo com suas preferências (com a informação disponível no momento da escolha). Só isso.
Um consumidor que faz escolhas racionais compra o que mais lhe agrada com os recursos que tem e o tempo que dispõe para procurar. Os gostos mais esdrúxulos são compatíveis com a hipótese de escolhas racionais.
Investidores racionais avaliam os riscos e retornos esperados das oportunidades de negócio para investir, mas também levam em conta fatores como o “apetite para risco do mercado” (este afeta o preço de venda do negócio).
Da mesma maneira, pais que fazem escolhas racionais e querem ajudar seus filhos a aprender a falar escolhem suas palavras para atender a esse fim. Assim, de acordo com a pesquisa de Deb Roy, os pais fazem escolhas racionais em sua comunicação com os filhos.
Esse exemplo é interessante porque pais e mães não ficam pensando na maneira de estruturar a comunicação com o bebê: eles fazem escolhas (que chamamos de) racionais sem sequer perceberem que estão fazendo uma escolha!
Antes de seguir, duas observações:
1. Muito se aprende estudando o mundo a partir da hipótese de escolhas racionais. Contudo, há situações onde a hipótese da “escolha racional” pareceria adequada, mas importantes aspectos das escolhas das pessoas fogem desse arcabouço.
Por exemplo, quando não somos capazes de resistir a tentações e escolhemos algo sabendo que vamos nos arrepender, ou não estamos escolhendo o que achamos melhor para nós mesmos, ou erramos ao nos arrepender.
Muita pesquisa em economia tem focado nas diferenças entre o que prescreveria a “escolha racional” e as escolhas das pessoas no mundo real. Lições interessantes têm brotado dessa linha de pesquisa (que, no Brasil, faz sentido classificar como ortodoxa).
2. Com frequência, confundem-se escolhas racionais com mercados eficientes. Uma coisa não tem nada a ver com outra.
Comportamento de manada e reação exagerada a notícias no mercado financeiro, crises financeiras, mercados que param de funcionar de repente, tudo isso é compatível com agentes perfeitamente racionais.
O fato de cada um buscar fazer o melhor para si (com a informação disponível) não significa que a economia como um todo funcionará bem.
Por que essa hipótese de escolhas racionais é importante?
Um político buscará escolher o melhor para si, assim como uma empresária, um estudante, etc. O melhor para mim pode incluir ajudar os outros (claro que não há nada irracional nisso), mas raramente essa será a única motivação do político, da empresária e do estudante.
O melhor para cada pessoa e, portanto, suas escolhas, dependem das regras do jogo (seja essas pessoa um político, uma empresária, etc).
Assim, para construir um país melhor, precisamos de regras do jogo que incentivem as pessoas a fazerem escolhas que contribuem com o todo.
Se queremos qualidade e honestidade na gestão e nas políticas públicas, mais investimentos, mais empregos e mais educação, temos que ter regras que façam com que essas escolhas sejam racionais para os políticos, os empresários, os estudantes, etc.
Referência:
– Uma breve explicação da pesquisa do Professor Deb Roy, com o gráfico deste post, pode ser encontrada neste vídeo de sua palestra.