A primeira reunião do Copom de 2016

Por Bernardo Guimarães

Ao aumentar uma das taxas de juros básicas da economia (a Selic), o Banco Central torna o crédito mais caro e, portanto, desestimula o investimento e a compra de bens duráveis. Assim, aumentos nos juros tem um impacto negativo na demanda por bens na economia.

Essa redução na demanda desestimula aumentos nos preços, ajudando, portanto, a segurar a inflação, mas também desestimula a produção, tendo assim um impacto negativo sobre a atividade econômica.

Via de regra, Bancos Centrais manobram os juros para segurar a inflação quando a economia está aquecida e estimular a produção quando a economia vai mal.

Com a economia em uma grande recessão e com inflação alta, o que deve fazer o Banco Central?

A prescrição “padrão” é que o Banco Central foque em manter a inflação na meta. A ideia básica é a seguinte:

Deixar de subir os juros hoje leva a um aumento na inflação. No futuro, para trazer a inflação de volta, o governo teria que subir os juros e desestimular a economia.

A escolha é, portanto, entre juros altos agora ou depois, mas quanto mais se demora para subir os juros, mais tempo ficamos com inflação alta.

Melhor então já subir os juros de uma vez?

Bem, a alta dos juros em um momento de forte recessão é particularmente ruim, então há vantagens em postergar esse aumento dos juros para depois.

OK, mas então por que a prescrição “padrão” é focar em manter a inflação na meta?

As ações do Banco Central afetam a expectativa de inflação. Se todos sabemos que o Banco Central foca em manter a inflação baixa, nós esperamos inflação menor para o futuro.

Essas expectativas afetam as decisões de pessoas e empresas na hora de negociar salários e decidir preços. Assim, a expectativa de inflação baixa empurra para baixo a própria inflação.

Por isso, a prescrição padrão é focar na inflação.

Entretanto, no momento, há dois fatores muito importantes para a decisão do Banco Central que afetam esse quadro.

O primeiro é o quadro fiscal. Se o governo não arrecada o suficiente para pagar as contas, é preciso arrumar outros meios de conseguir dinheiro. Em geral, toma-se dinheiro emprestado.

Contudo, se a dívida é muito alta, começam a existir dúvidas sobre a capacidade de repagamento. Tomar emprestado fica mais caro e mais difícil.

Nesse cenário, é possível que a inflação acabe sendo o imposto que ajuda a fechar as contas (como eu expliquei em alguns posts, como este).

Juros mais altos aumentam a conta do governo; inflação mais alta reduz essa conta. Assim, uma alta nos juros é má notícia para a situação fiscal.

Portanto, em uma situação de dívida alta e desequilíbrio fiscal, o aumento nos juros pode tornar ainda mais difícil segurar a inflação no futuro.

Assim, sob o ponto de vista estritamente econômico, a posição contra o aumento de juros hoje é perfeitamente defensável. Se o remédio com efeitos colaterais não funciona bem, para que tomá-lo?

Há, porém, um segundo fator, ligado à política.

De acordo com as notícias, há bastante gente no PT e no governo pressionando por juros mais baixos.

Apesar da posição sobre os juros ser razoável em termos econômicos, pressões políticas sobre o Banco Central, em geral, não são. Mais importante, o caminho para a economia que essas pessoas defendem é desastroso.

No primeiro mandato, Dilma buscou trilhar esse caminho. Nessa toada, o Banco Central levou a taxa Selic para 7,25% em 2012 (apesar da inflação em alta e acima da meta).

O resultado foi o aumento da inflação dos preços que o governo não controla. A economia passou a ir de mal a pior (apesar de juros baixos, em geral, estimularem a demanda).

O problema foi a perda de confiança na condução da economia.

Nesse segundo mandato, o governo tem sinalizado uma mudança de postura. Porém, pairam dúvidas sobre o que o governo de fato pretende fazer e sobre sua capacidade de colocar seus planos em prática.

Muitos no PT continuam defendendo o desrespeito às leis da economia e apresentando propostas sem pensar de fato em suas consequências (como ilustra essa proposta).

Nesse contexto, uma alta dos juros poderia ser uma mensagem ao mercado mais ou menos assim:

“Todos sabemos que há gente no governo e no PT que ainda defende as políticas adotadas durante o primeiro mandato, que nos trouxeram a essa crise. Essas pessoas não estão dando as ordens aqui.”

Essa mensagem poderia ajudar o governo a conquistar um pouquinho da confiança perdida. Por outro lado, não mandar a mensagem poderia levantar mais dúvidas.

Claro, a mensagem só funciona se acabar sendo mesmo uma demonstração de força. Muitos no PT chiariam. O fogo amigo seria disparado contra o Banco Central. Gente como Jaques Wagner teria que matar essa bola no peito e controlar o jogo.

A presidente não se pronunciaria, mandando outra mensagem: “aquela história de pratos de comida sumindo das mesas por conta de um BC independente, que contamos durante a campanha, era uma mentira deslavada, fiquem tranquilos.”

Em suma, em termos puramente econômicos, não é nada claro que o BC deva subir os juros, apesar da inflação alta, por conta da recessão e do quadro fiscal.

Contudo, a oposição de setores do PT à alta dos juros oferece ao Banco Central a oportunidade de mandar uma mensagem. A alta dos juros seria o preço dessa mensagem.