Fala-se muito sobre o efeito das flutuações nos preços das commodities (produtos agrícolas e minerais) sobre a economia brasileira. Variações nos preços das commodities são citados como explicações para o bom e o mau desempenho da economia brasileira em diferentes períodos.
Afinal, quão importantes são as exportações de commodities para a economia brasileira? Qual o efeito de flutuações nos preços das commodities sobre a nossa economia?
Uma maneira de começar a pensar sobre essa questão é a seguinte: suponha que o preço de todas as commodities aumente em, digamos, 5%. Se nada mais se alterar na economia, o que acontece com a renda do país?
Quando sobe o preço das commodities, recebemos mais pelo minério de ferro exportado, mas pagamos mais pela importação do trigo. Assim, o efeito de um aumento no preço das commodities depende da diferença entre quanto exportamos e quanto importamos.
O gráfico abaixo mostra essa diferença, as exportações líquidas de commodities, como percentual do PIB, para todos os países da América do Sul.
O gráfico mostra que, como proporção do PIB, as exportações líquidas de commodities do Brasil são muito pouco significativas. Nessa base de dados, correspondem a 4% do nosso produto.
Em uma analogia com uma pessoa com uma renda mensal de R$ 10.000, as exportações de commodities do Brasil correspondem a vendas de produtos agrícolas que a pessoas cultiva e que rendem R$ 400 por mês. O ponto é que flutuações nos preços desses produtos agrícolas vão ter um efeito relativamente pequeno na renda comparado com qualquer efeito nos outros R$ 9.600.
Na Argentina, as exportações líquidas de commodities como proporção do PIB são cerca de 2 vezes mais que no Brasil. No Chile, 4 vezes mais. Na Bolívia, 8 vezes mais.
Uma queda no preço de todas as commodities de 5% tem um efeito direto na economia do Chile de 0,8% do PIB, mas um efeito negativo de apenas 0,2% do PIB no Brasil.
Dizendo de outra maneira, flutuações nos preços das commodities que causassem um grande impacto no Brasil abalariam enormemente as outras economias sul americanas.
Mas as commodities não são responsáveis por uma boa parcela das exportações do Brasil? São, mas como expliquei neste post, o Brasil troca pouco com o exterior. Assim, flutuações nos preços dos produtos que exportamos são muito menos importantes para o Brasil que para qualquer outro país sul-americano.
Além disso, o Brasil exporta uma variedade relativamente grande de commodities (no dado de 2012/2013, o minério de ferro representa cerca de 20% das nossas exportações de commodities). O cobre representa mais que 60% das exportações de commodities no Chile; O petróleo é mais que 60% das esportações de commodities na Colômbia; etc.
A alta nos preços das commodities beneficiou a economia brasileira entre 2003 e 2007, mas esta é apenas uma parte da história. A política econômica entre 1999 e 2005 foi muito mais importante, por preparar o terreno para o crescimento da década passada.
Da mesma forma, o recuo nos preços das commodities explica muito pouco do desempenho ruim da nossa economia a partir de 2012 que culminou com a crise atual. A explicação está na política econômica adotada a partir de 2010.
Usar a queda dos preços de commodities em setembro e outubro de 2014 para justificar a grande diferença entre o discurso de campanha e as (tentativas de) ações do segundo governo Dilma ultrapassa os limites do ridículo. O preço do petróleo de fato caiu muito no período, mas o efeito disso no Brasil é ínfimo se comparado a países como a Colômbia — que de fato sofreu com a queda, mas está crescendo 2,5%-3% esse ano.
Como disse José Scheinkman em entrevista recente à Folha, a maior ameaça à economia brasileira são os problemas internos. Como há sempre um intervalo de tempo entre a implementação de políticas econômicas e seu efeito sobre a economia, nem sempre é fácil perceber a ligação. Mas as explicações para o que tem acontecido no Brasil estão nas políticas que temos adotado.
Referências:
– Dados do relatório da UNCTAD, “State of Commodity Dependence” de 2014.