A taxa de juros americana e as economias emergentes

Por Bernardo Guimarães

A taxa de juros norte-americana em termos reais (já descontada a inflação do dólar) pode ser vista, de maneira bem simplificada, como uma espécie de taxa Selic do mundo. Quando os juros reais americanos estão baixos, títulos do governo norte-americano são menos atraentes. Assim, empresas e governos de outros países conseguem tomar dinheiro emprestado a juros menores. 

A figura abaixo mostra a taxa de juros real nos Estados Unidos nos últimos anos.*

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Desde 2011, as taxas de juros reais têm estado em níveis muito baixos. Comparando com a média histórica, a diferença é de cerca de 2% ao ano. As baixas taxas de juros internacionais tornam oportunidades de investimento em países emergentes bastante atrativas.

A preocupação atual em países emergentes com o aumento na taxa de juros nos Estados Unidos realça um aspecto importante e pouco mencionado do cenário internacional recente. Sim, desde 2009, os países desenvolvidos têm crescido menos que de costume e isso reduz a demanda por exportações de países emergentes. Mas por outro lado, as baixas taxas de juros nos Estados Unidos tornam mais atraente o investimento em outros países.

Como consequência, ao contrário do que sugere o discurso oficial, o produto dos países emergentes cresceu cerca de 5% ao ano entre 2011 e 2014. Não foi o cenário internacional a causa do fraco desempenho da economia brasileira.

 

O que acontece agora quando o juro nos Estados Unidos subir?

Um aumento na taxa de juros norte-americana tem um efeito direto sobre os juros da dívida de países emergentes: eles precisam pagar juros maiores para tomar emprestado. Esse aumento torna mais custoso o pagamento da dívida e, portanto, maior a chance de um eventual calote. Assim, um aumento na taxa de juros norte-americana tende a levar, também, a um aumento no prêmio de risco na dívida de países emergentes.

Para dar uma ideia do tamanho desse efeito, em trabalho publicado em 2013, eu e Nathan Foley-Fisher estimamos que um aumento inesperado de 1 ponto percentual na taxa de juros norte-americana gerava, em média, um aumento de cerca de 2 pontos percentuais na taxa de juros paga pelos países emergentes: 1 ponto percentual pelo aumento nos juros americanos mais 1 ponto percentual pelo aumento no prêmio de risco (aproximadamente).

Entretanto, de modo geral, os juros americanos estão mais altos quando a economia americana está mais forte. Nosso trabalho mostrava também que os outros fatores que levam a uma maior taxa de juros nos Estados Unidos tendem a contrabalançar o efeito no prêmio de risco.

Em suma, o aumento na taxa de juros de fato tornará mais caro o crédito para países emergentes. Contudo, esse aumento será feito de forma gradual e os juros só estarão de volta aos níveis usuais quando a economia americana estiver bastante aquecida.

Assim, para quem trabalha no mercado financeiro, é fundamental prestar atenção nos juros americanos. Mas para o debate sobre a economia brasileira, o fundamental é olharmos para a nossa política econômica.

Referências:

– O gráfico da taxa de juros mostra a taxa nos títulos norte-americanos de 10 anos indexados à inflação e está disponível no site do FED St Louis.

– O trabalho que eu mencionei é Foley-Fisher, Nathan and Guimaraes, Bernardo, “US real interest rates and default risk in emerging economies”, Journal of Money, Credit and Banking, 2013.